tag:blogger.com,1999:blog-34962543615738582752024-03-13T11:14:08.383-07:00Blog da ListaNesta lista - como num rio - correm as veias dos poetas, nas pedras que rolam e rebolam.
Ana Maria Costa e Sónia ReginaFilipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.comBlogger61125tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-45815725065801224122007-12-08T03:04:00.000-08:002008-12-10T19:10:23.340-08:00Antologia de Natal Edium 2007<div align="left"><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEir8wlU7ZVspw-TDQqptAl97B64dq7-sFlzpCWsSw9hXvfX9jwKVWsCouNMHdk7BNKClxNncfF5CM0ytKeNPRwS7LAXFyzqk4CTrSqr1xskN5CEF8SRja6TLVrrJIzjqJbJVOEoqtQu4lGw/s1600-h/capa%252Bantologia%252Bnatal.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5141556449522705874" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEir8wlU7ZVspw-TDQqptAl97B64dq7-sFlzpCWsSw9hXvfX9jwKVWsCouNMHdk7BNKClxNncfF5CM0ytKeNPRwS7LAXFyzqk4CTrSqr1xskN5CEF8SRja6TLVrrJIzjqJbJVOEoqtQu4lGw/s400/capa%252Bantologia%252Bnatal.jpg" border="0" /></a><span style="color:#990000;"> Participantes na antologia:<br /><br /></span>Albano Chaves, Natal<br />Alves Bento Belisário, Já bate à porta, dia de festa<br />Ana Maria Costa, Natal: alegrias e aletrias<br />Andityas Soares de Moura, Poema para ser lido na ceia de Natal<br />André Veríssimo, O Granito e o Vidro<br />António Durval, Presépio<br />António Mendes, Ao Homem<br />Bernardete Costa, O Presépio<br />Camilo Almeida, Um Natal imprevisto<br />Carlos Luanda, Noite de Natal<br />Conceição Paulino, Natal<br />Daniel Gaspar, Natal 81<br />Elvira Castanheira, É Natal quando…<br />Ercília Freitas, Uma moedinha, que é Natal<br />Eunícia Salgadinho, Um Pai Natal que se chamava João<br />Francisco Coimbra, Natal<br />Gilberto Russa, Silêncios da noite… Felicidade do dia<br />Jorge Monteiro, O Natal: A Promessa cumprida por Deus<br />Joaquim Evangelista, Nascimento de Jesus<br />Jorge Casimiro, Devia ser Natal<br />José Félix, carta para o pai natal<br />José Gomes, O Quarto Rei Mago<br />José Salgadinho, O acerto de contas<br />Maria Emília Costa Moreira, Natal a Duas Vozes<br />Maria Fernanda Guedes de Amorim, Um Sonho de Natal…<br />Maria João Coimbra, O Natal dos Animais<br />Maria Mamede, Uma Estrela<br />Maria Rita Romão, Noite sem luar<br />Palucha Hipólito Perdigão, Conto Natalino<br />Paula Carvalheiro, Azevinho<br />Paulo Themudo, O Anunciar da Estrela<br />Teresa Gonçalves, Em asas de amor…<br />Vera Carvalho, Que nasça um filho de Deus todos os dias<br />Xavier Zarco, Prenda </div><div align="left"> </div><div align="left"><a href="http://www.ediumeditores.blogspot.com/">Edium Editores</a></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/15776046583079010872noreply@blogger.com12tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-38612275140808553592007-12-08T03:01:00.000-08:002008-12-10T19:10:23.640-08:00"Nascido tarde" de Ana Maria Costa<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgiL6C_iGikDZDnvMM1YLkGViMKds-tlCb0q_wiH0UXcLgnkvSjp3j_dVRMcVXi4wTjqpDowGFJmb0W5NImmndvthNtfIN5Uz70Rbm7tT44Mw6myOrxXbsusicwctzEN0tKS-NojHKIvd7o/s1600-h/conv%252Bnascido%252Btarde.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5141555856817219010" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgiL6C_iGikDZDnvMM1YLkGViMKds-tlCb0q_wiH0UXcLgnkvSjp3j_dVRMcVXi4wTjqpDowGFJmb0W5NImmndvthNtfIN5Uz70Rbm7tT44Mw6myOrxXbsusicwctzEN0tKS-NojHKIvd7o/s400/conv%252Bnascido%252Btarde.jpg" border="0" /></a> Editora <a href="http://www.ediumeditores.blogspot.com/">Edium Editores</a><br /><div></div>Anonymoushttp://www.blogger.com/profile/15776046583079010872noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-45983392828515996602007-11-10T15:36:00.001-08:002007-11-10T15:36:34.604-08:00AmizadeAMIZADES - este é um pedido do coração - A SOLIDARIEDADE EM ACÇAO E A LITERATURA EM CIRCULAÇÃO<br /><br />A EDIUM EDITORES, <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://ediumeditores.blogspot.com/" target="_blank">http://ediumeditores.blogspot.com/</a> <br /> <br />com cerca de 80 títulos publicados, prestes a fazer dois anos que iniciou sua actividade, vai editar um livro meu, prosa, «Salvador, o Homem e Textos InConSequentes».<br />É uma editora pequena, mas esforçada na divulgação da cultura.<br />Tem publicado autores não muito conhecidos e jovens autores, o que, à partida não garante grandes receitas, ora sendo o objectivo maior a divulgação da literatura tem na mesma que ser rentável senão ...morre .<br /><br />Asim o seu proprietário, agente directo em todas as fases do processo, pretende promover a venda on-line, no futuro.<br /> Para já, para garantir a cobertura dos custos, ensaiou esta modalidade que vos proponho:<br /><br />Quem quiser pode (POR FAVOR LEIAM E RESERVEM SEM PROTELAR SENÃO ESQUECEM) fazer uma pré-reserva do número de livros que se propõe adquirir, para:<br /> <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="mailto:ediumeditores@gmail.com" target="_blank"> ediumeditores@gmail.com</a><br />Valor da capa: 10,00€/livro<br />Nº de pág. + ou - 80<br />Serão convidadas/os,via email e moradas, os que detenho, para apresentação do livro no início de Dezembro.<br />Quem fizer pré-reserva e pagar por cheque ou transferência bancária (acordar com o Editor- ver site acima referido) fica isento d os custos dos CTT OS QUAIS , COMO SABEM, SÃO BEM GRAVOSOS.<br /><br />Agradeço que quando fizerem as vossas pré-reservas (muitas) - lembrem-se das prendinhas de Natal - ao enviarem o email ao editor me enviem o mesmo email em:c.c.<br />Fazemos trabalho conjunto.<br />« S inopse: de «Salvador, o Homem e Textos InConSequentes»<br /><br />O livro pode ser decomposto em duas partes, das quais,«Salvador, o Homem» abrange cerca de um terço.<br />Mais próximo da novela do que do conto relata a experiência de Salvador ao descobrir o fantást ico que a vida encerra e que o mundo é muito mais do que o que vemos no dia a dia, assim como nele, enquanto ser humano,existem dimensões inexploradas, até ignoradas que ao descobrir e as integrar no seu todo alteram sua vida e de todos ao seu redor.<br /><br />Os textos restantes enquadram-se mais no conceito americano de short-stories e diversificam o leque de leitura de uma forma que cremos será de vosso agrado e que o próprio título vos permite intuir a existência d nexos, aparentemente inexistentes.»<br /><br />Minhas e meus amigos, nesta hora de "parir" mais uma cria conto convosco.<br /><br />Desejo uma boa semana e P.F. divulguem esta informação pelos vossos contactos pois poderá haver pessoas eventualmente interessadas.<br /><br />Bj<br /><br />Luz e paz em vosso caminhar e ao vosso redor<br /><br />Conceição PaulinoAnonymoushttp://www.blogger.com/profile/15776046583079010872noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-66049573929242828652007-11-06T01:00:00.000-08:002008-12-10T19:10:23.906-08:00"Cresço em maré, quando mergulhas em mim",<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhjAxL2VSxLa_zMvUflbrYlCAndXsl59teH2otrJHaEU-xXDEv54ScHX-BomDtmAzkCfQjGHzbp79LUdT3mLh7yEabNaJrDa8rr7t91vK4CFuAj0cPhQZneadEpjfZyZSJe1G6X-rPinjA/s1600-h/Maré.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5129651818551300050" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhjAxL2VSxLa_zMvUflbrYlCAndXsl59teH2otrJHaEU-xXDEv54ScHX-BomDtmAzkCfQjGHzbp79LUdT3mLh7yEabNaJrDa8rr7t91vK4CFuAj0cPhQZneadEpjfZyZSJe1G6X-rPinjA/s320/Mar%C3%A9.jpg" border="0" /></a> ( Foto: Autor desconhecido)<br /><div><br /><div>de Carlos Luanda, in " O Mar"<br /></div><br /><br /><div></div><br /><br /><div></div><br /><br /><div><br />01<br /><br />Quando vens mar,<br />rio.<br />Quando vens córrego,<br />sigo.<br />Se és regato,<br />canto.<br />Quando és Atlântico-<br />ó força espantosa<br />que escora meu cio,<br />meus anseios,<br />orgasmos<br />e desvarios -<br />“cresço em maré<br />quando mergulhas<br />em mim”.<br /><br /><br />02<br /><br />Recebo-te de braços abertos<br />para que me possuas<br />sobre as rochas<br />plantadas sob meus pés.<br /><br />Vens assim,<br />agitado espumante<br />pigmentas minh'alma<br />e sentes meu gosto<br />de destino<br /><br />Envolves-me em tuas águas<br />festejando o encontro ritmado<br />Dos braços – toques, das pernas – abraços<br />da pele dos poros – arrepios<br /><br />Vens, cresço em maré,<br />ao receber-te em mim<br />mar, mar atlântico!<br /><br /><br />03<br /><br />Altivo e voluntarioso. é<br />fogueira que alimenta<br />o fogo: assim, ao pé,<br />mesmo por essa mão;<br />que acariciando<br />promessas suaviza,<br />desliza. cede a seda,<br />desnudando contornos,<br />perante os flamantes olhos<br />faiscantes, sentidos ocultos<br />de esguios, corpos unos<br />aturdidos instantes<br /><br /><br />04<br /><br />cresce a maré e o vento do mar<br />corre a linha do rego da areia<br />grão a grão<br />no mergulho segredo sabor marinho<br />verde azul branco sopro espuma<br />saciando o silêncio desejo<br />que conserva em si de a possuir<br />e ela bebe...beija...bebe<br />a salgada aventura de o sentir<br /><br /><br />05<br /><br />Na ponta de uma corda<br />que construo com as flores,<br />em dança noturna<br />eu te desenho<br /><br />e, numa estratégia da água<br />da alma, te deixo entrar.<br /><br />Minha pele abre-se em aves,<br />quando mergulho em ti;<br /><br />cresces, em maré,<br />danças comigo o poema<br /><br />até que as mãos toquem<br />o chão. E sejam.<br /><br />E agarrem a vida em forma de areia.<br /><br /><br /><br /><em>Índice de autores:<br /><br />01 – Maria Limeira<br />02 – Andréa Motta<br />03 – Luís Monteiro da Cunha<br />04 – Ísis<br />05 – Sónia Regina</em></div></div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-20142552084990956932007-11-02T02:28:00.000-07:002008-12-10T19:10:24.009-08:00"Pequenas luzes absorviam o que restava da escuridão"<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhAbFMNxQ9yssMLL_cYFMiANujE1vgR1Ln2tZecJYQOFBd8dmeEU_J-dloy-TZOVK7TxQsjz8AB8bDxeTlZdWUmDAuMB5FUGb3Cm5KGrSuCQS87eq4TYW4GKECi18tkXS5BoqsjNLXzQn4/s1600-h/Luz+nos+Olhos.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5128175917464539058" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhAbFMNxQ9yssMLL_cYFMiANujE1vgR1Ln2tZecJYQOFBd8dmeEU_J-dloy-TZOVK7TxQsjz8AB8bDxeTlZdWUmDAuMB5FUGb3Cm5KGrSuCQS87eq4TYW4GKECi18tkXS5BoqsjNLXzQn4/s320/Luz+nos+Olhos.jpg" border="0" /></a> (Foto: autor desconhecido)<br /><br /><div>de Paulo Themudo, in "Os olhos espelham"<br /></div><br /><div></div><br /><div><br />01<br /><br />Ah, como é chegado o momento<br />sem tempo de mais ser do<br />que o silêncio puro,<br />envolto de nudez<br />no seu manto de dedos,<br />nascentes de rios<br />correndo lábios de céus.<br />Ah! Silêncio que explodes<br />em mil e mais cores<br />nas gotas suadas,<br />numas peles que já só sentem<br />que eternidade não é o tempo.<br />É o infinito no momento<br />que se incendeia por dentro<br />e renova de luzes<br />o fogo do firmamento...<br /><br />02<br /><br />tal qual vela<br />silenciosa<br />roubadora de silêncios<br />e da pouca claridade que ainda resta<br />ali<br />num canto do coração<br />como se a se esgueirar<br />de fino<br />pela fresta<br /><br />e ainda [na penumbra]<br />executar canção<br /><br /><br />03<br /><br />a)<br />somos olhos fechados dançando<br />num abraço embalado<br />na música<br /><br />com o teu aroma<br />e meu amor<br /><br />imaginei este poema assim<br /><br />b)<br /><br />os teus braços rodearam-me<br />ergui-te pela cintura<br />para um beijo<br /><br />com o nosso amor<br />e foi romã<br /><br />esse sabor de lábios-frutos<br /><br />c)<br /><br />escorre aqui um sabor bom<br />do que a imaginação<br />dá da memória<br /><br />com o seu poder<br />e arte sã<br /><br />nu nó onde nós nus somos<br /><br />d)<br /><br />vendo o universo luzente<br />absorver as luzes<br />e restar...<br /><br />da escuridão<br />a noite<br /><br />com o calor tépido abraço<br /><br />e)<br /><br />numa dança para encher<br />o próprio destino<br />bailo ainda<br /><br />o que se pode dizer<br />com o corpo<br /><br />transportado às palavras<br /><br /><br />04<br /><br />o meu corpo parecia perdido<br />que luzes eram sois<br />pequenos nos meus olhos.<br /><br />05<br /><br />amanhecia, no mais longe<br />onde a vista alcançava<br /><br />de lá, pouco a pouco,<br />iam se aproximando<br />os contornos<br /><br />a relação entre as coisas<br />estava prestes a acontecer:<br /><br />"pequenas luzes absorviam<br />o que restava da escuridão"<br /><br />06<br /><br />Por um tule tecido de evidências<br />encerra-se a fronteira da vontade,<br />o desejo, absorvido de oportunidade,<br />escorre da fronteira desse ínfimo espaço,<br />que medeia a transparência, de ser<br />não estar, não se ver, adivinhar,<br />querer, sempre adiado, o abraço<br /><br />apesar de continuar na escuridão.<br />as formas são deleites, absorvem<br />a explosão dos luzeiros que fenecem<br /><br />por puro prazer.<br /><br />acontecer é o gesto adiado,<br />frenético e febril.<br />uma luz a explodir<br />na antevisão do que escurece<br /><br />ah! delicioso tormento<br />apetece antecipar:<br />aparece, desaparece,<br />­ – não parece – é… movimento!<br /><br /><br /><br /><em>Índice de autores:<br /><br />01 – Carlos Luanda<br />02 – Eliana Mora<br />03 – Assim<br />04 – Ana Maria Costa<br />05 – Sónia Regina<br />06 – Luís Monteiro da Cunha</em></div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-78219235266664085032007-10-23T06:45:00.000-07:002007-10-23T06:46:50.725-07:00O Alfabeto dos Animais,<div align="justify">por Maria João Oliveira<br /><br />Sofia conhece o "alfabeto" dos animais desde a sua infância. Decifra com mestria as palavras de amor que eles escrevem em código. Sabe que eles também possuem inteligência e sentimentos.<br />- O que é que tu tens, Sofia? Esse meu cão tem mau génio, ninguém se pode aproximar dele e só por especial favor, aceita uma carícia minha. Não te conhecia, mas abana o rabo, corre para ti, mete a cabeça nas tuas mãos, deita-se a teus pés! O que é isso? O que se passa?!...<br />- Não sei, Carlos. Olho-os nos olhos com todo o amor que sinto por eles. Só isso.<br />- Pois é – murmura o amigo, emocionado –, está aí o segredo.<br />Naquele momento, Carlos sentiu-se mais pequeno que um grão de areia, perante os olhos rasos de lágrimas da sua amiga.<br />Sofia trava, desde criança, uma luta titânica contra a indiferença e a falta de sentimentos. E como os monstros são incansáveis, o sofrimento dos animais não tem férias. Por isso, ela se gasta, há muitos anos, sem medir nem calcular, num tormento quotidiano, a matar a fome, a tratar feridas e pernas fracturadas de cães, gatos, pombas, etc., vítimas de maus tratos de toda a espécie. Sofre também com o drama dos animais de "estimação", mas a sua dor raramente consegue atravessar a dureza do granito, a não ser quando recorre aos organismos de protecção dos animais. Contudo, estes também já estão exaustos e sentem-se impotentes, sobretudo perante milhares de cães e de gatos, abandonados nas férias, pelos seus próprios donos e que acabam por ser abatidos nos canis municipais.<br />- Quantos deles – pensa Sofia – ofereceram calor e conforto, durante todo o ano, aos seus donos, quando eles chegavam a casa, cansados, deprimidos, irritadiços… A comovente alegria dos animais, naqueles momentos, merecia um hino.<br />E pensava também num lindo gato branco, peludo, cheio de charme, de expressão angélica, que se esquecia da cauda e dos ramos das árvores em que se baloiçava, mal via os donos chegar a casa. Corria ao encontro deles, com aquele ternurento miar de boas-vindas, os olhos dourados a brilhar muito, o coração prontinho para dar e receber… Chamava-se Sião.<br />Algum tempo depois, Sofia encontra-o, sem vida, junto de um contentor de lixo. Tinha sido apedrejado até à morte, numa bela tarde de verão, enquanto os donos saboreavam gelados e tomavam banhos de mar.<br />Por vezes, a alegria de estar com os amigos arrefece dentro dela, em redor de uma mesa festiva. Não é fácil assistir ao entusiasmo das pessoas, perante o sabor da "bela chanfana" ou do leitão assado, com a boca aflitivamente aberta e uma laranja entre os dentes. Lembra-se do artigo 13º ("O animal morto deve ser tratado com respeito"), da Declaração Universal dos Direitos do Animal. A dor e a angústia que o animal sofreu são bem visíveis, mas só ela se apercebe disso. E o odor que ele exala excita as pessoas que acabam por esquartejá-lo com insuportável prazer. Sofia olha os amigos em silêncio, come uma batata frita para disfarçar e sai discretamente para o jardim.<br />Por vezes, fica exausta e sente necessidade de ser como os outros, de soltar o grito do Ipiranga, de adormecer no rio do esquecimento… No entanto, como ave da esperança, ela continua a semear nos seus alunos a compaixão, a ternura, o amanhecer de um tempo novo. E fala-lhes do autor de "O paraíso dos animais", o poeta basco Francis Jammes , porque ninguém como ele se compadeceu tanto do seu sofrimento. Ninguém como ele nos faz estremecer ao falar da "luz profunda e suavemente triste que existe no olhar dos animais", ao lembrar os dromedários apertados como sardinhas enlatadas, numa barraca de feira, os frangos transformados em prémios de rifas e arrastados loucamente por uma roda, em constante movimento, com um leitão apavorado no meio, o vitelo "para engorda", separado da mãe, uma semana depois de nascer, encerrado num caixão às escuras e submetido a monstruosas torturas, para engordar mais de um quilo por dia …<br />Quase no fim do ano lectivo, os alunos do 11º ano apresentaram uma dissertação sobre experiências médicas com animais, em todo o mundo. Ao ler a dissertação do Telmo Raimundo, Sofia chorou. Tentando extirpar o cancro da indiferença, ele procurou levar os seus potenciais leitores a pensar, a sentir, a agir… E falou das cordas vocais cortadas a cães submetidos a experiências, para deixarem de ouvir os seus ganidos, apontou o dedo às universidades onde se corta a cabeça a animais, se abre o seu tórax e se lhes retira o sangue até à paragem cardíaca. E não esqueceu o Método Draize que introduz no estômago de cães e de roedores produtos de limpeza, pesticidas, cosméticos, até ao seu rompimento, que imobiliza coelhos conscientes e os impossibilita de fechar os olhos com substâncias que provocam infecções, hemorragias, cegueira. Raspam também os pêlos dos animais, retiram camadas de pele e colocam substâncias corrosivas sobre a carne viva. E o Telmo falou também dos métodos alternativos à utilização de animais em pesquisas, que já vão sendo postos em prática, embora se verifique ainda uma grande falta de sensibilidade por parte de alguns cientistas. Dizia ainda o Telmo que a actividade científica não pode estar acima das questões éticas. E citava Mia Couto, escritor que muito admira: " O mundo é uma pegajosa teia, onde uns são presas e outros predadores".<br />Nos jornais da sua cidade, Sofia tenta salvar a dor dos animais, da indiferença e do esquecimento. E fala dos que estão ameaçados de extinção, dos touros ensanguentados na arena, dos que sofrem nas mãos dos seus próprios donos, dos agricultores, dos cientistas, dos caçadores de peles que matam focas à paulada, das crias que são esfoladas vivas e se arrastam num choro pungente…<br />Sofia chama também a atenção para o sofrimento das pombas da cidade que aparecem no seu terraço com as patas fracturadas e os dedos dilacerados por armadilhas, ou vítimas de venenos que lhes roubam o sentido de orientação e a coordenação dos movimentos. Tentam desesperadamente voar, mas embatem nos edifícios e caem no chão, onde ficam, durante muitos dias, a debater-se até à morte.<br />Num dos jornais que Sofia assina, uma responsável da "SOS Animal"denunciou: "A perversidade humana não tem fim. (…) Os animais são espancados com paus, enrolados em arame farpado, atirados de pontes, afogados, queimados, mutilados para rituais satânicos e até vítimas de abuso sexual."<br />Por tudo isto, Sofia afirma que, para se divertir ou em nome da ciência, da economia e do espectáculo, o homem trata estes seres indefesos com ilimitada crueldade. Está a anos-luz da ética do antigo Egipto, por exemplo, que fomentava a responsabilidade para com os animais. Toda a falta de respeito era considerada como pecado. Sofia não esquece uma inscrição numa pirâmide que justificava o falecido rei "(…) Não existe qualquer queixa contra Fulano por parte de um ganso / Não existe qualquer queixa contra Fulano por parte de uma vaca" (o ganso e a vaca eram os representantes do reino animal).<br />Ao pensar no poeta basco Francis Jammes, Sofia sente que o seu fardo se torna mais leve. E a sua gratidão é orvalho sobre aquela longa noite de pesadelo. A dor que ele sentia perante um animal maltratado era tão parecida com a sua!… Já fazem parte de si estas palavras que o poeta , um dia, proferiu: "(…) Se não fosse o respeito humano, eu ter-me-ia ajoelhado perante tanta paciência e tantas torturas (…)".<br />Um dia, Francis Jammes convidou todos os poetas a acolher os animais torturados no seu coração. Franz Werfel escutou o seu apelo. Por isso, Sofia devora a sua "Ode aos animais sofredores", como quem devora um fruto maduro depois de uma fome de séculos. Continua a pedir aos seus alunos que acolham todos os animais torturados no seu coração. E, aos poucos, eles vão aprendendo a descodificar o maravilhoso "alfabeto" dos animais. </div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-27668298787268937992007-09-23T13:46:00.000-07:002008-12-10T19:10:24.127-08:00Corrente de amizade<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEigk8lX42aU88cTxMacAoqkR_gIFyNRDQN5rHcGr_fTHOIXu3d7fXYkFrQrGx_OFjl2ElU2s5XAiBMN8nNLbXkzkDl_ZB1iOLPbk_ybYUAH3y4TenmCqsxf9lwfFjLqZ8Spl26NLsbMhC9u/s1600-h/corrente.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5113504047120363266" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEigk8lX42aU88cTxMacAoqkR_gIFyNRDQN5rHcGr_fTHOIXu3d7fXYkFrQrGx_OFjl2ElU2s5XAiBMN8nNLbXkzkDl_ZB1iOLPbk_ybYUAH3y4TenmCqsxf9lwfFjLqZ8Spl26NLsbMhC9u/s400/corrente.jpg" border="0" /></a> Agradeço ao blog "<a href="http://moendocafe.blogspot.com/">Moendocafé</a>" pela divulgação do meu blog, conduzindo esta corrente de amizade para mais e mais amigos.<br /><br />A corrente da amizade tem por objectivo promover a solidariedade e o convívio entre blogues.<br /><br />A vozquenaosecala faz as seguinte nomeações:<br /><br /><a href="http://moendocafe.blogspot.com/">Moendocafé</a> de Ninho de Cucos<br /><br /><a href="http://boscosobreira.com/">A pedra e a fala de Bosco Sobreira</a><br /><br /><a href="http://barcosflores.blogspot.com/">Barcos e flores de Amélia Pais</a><br /><br /><a href="http://atraducaodamemoria.blogspot.com/">A tradução da memória de Alice Campos</a><br /><br /><a href="http://www.onelightpublishing.com/">onelightpublishing de Alexandra Oliveria e Joseph Sherman</a><br /><br /><a href="http://diariopoetico.weblog.com.pt/">Diário Poético de Constatino Alves</a><br /><br /><a href="http://ateiadaaranha.blogspot.com/">A Teia da Aranha de José Félix</a><br /><br /><a href="http://xavierzarco.no.sapo.pt/">Xavierzarco de Xavier Zarco</a><br /><br /><a href="http://perigososcontactos.blogspot.com/">Perigosos contactos de Mónica Correia</a><br /><br /><a href="http://cisnenegrocisne.blogspot.com/">Cisno negro de Zénite</a><br /><br />Cada um dos nomeados deverá nomear outros 10 numa postagem , idêntica a esta, onde colocará a imagem aqui representada.<br /><br />muitos jinhosAnonymoushttp://www.blogger.com/profile/15776046583079010872noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-86406707504948694342007-09-23T03:42:00.000-07:002007-09-23T03:45:33.849-07:00"De alegria, de ternura, de compaixão. Dá vontade de enlouquecer."de, Virgílio Ferreira, in "Pensar"<br /><br /><br />01<br /><br />também vim do caos, noite.<br />não fermentava, a cor,<br />esquecida do tempo;<br />a luz, nada inaugurava<br /><br />a não ser o poema, tudo passa<br /><br />na alegria, na ternura,<br />o dia não é a realidade<br />olhada com o pensamento<br /><br />por isso não existes, resides<br />ou te inventas. eu, tampouco.<br />somos palavras frescas,<br />recém-escritas, soltas,<br />livres de compaixão<br /><br />as que palpitam, sem qualquer<br />entendimento. no papel,<br />a vontade de enlouquecer<br /><br /><br />02<br /><br />Uma só palavra ascende o espírito<br />Perante a lascívia que corrói o corpo<br />Perante a devassa deste mundo<br />A imaginação é o berço da viajem<br />Efémera razão que combustiona<br />A evasão do tumulto se encerra<br />– Nem que seja por um segundo – <br />a dor do amor da guerra e do prazer<br />da volátil alegria de ternura emergente <br />onde toda a compaixão dá vontade<br />apenas de enlouquecer sem pensar<br />sem pensar como Virgílio derradeiro<br />viver apenas e só o momento único<br />sem futuro em que investir o segundo <br />resta o primeiro espírito ou fracção<br /><br /><br />03<br /><br />Dizem-me que sou feito só de tripa,<br />o que nelas me iguala ao animal,<br />que a alma em lodo toda se dissipa<br />quando chegar a recta em seu final.<br /> <br />Renego a excomunhão de ser de cal<br />quando em cinza, apagada condição,<br />me embrulharem nas folhas de um jornal<br />e me espalharem no correr de um chão.<br /> <br />O Homem ainda é a besta alcantilada<br />que no alto degrau da criação<br />rasteja em vão em jaula amuralhada…<br /> <br />Mas ainda há luz no fundo da matéria<br />para levar o bater do coração<br />a transcender o pó desta miséria!…<br /><br /><br />04<br /><br />... o melhor que temos,<br />distingue,<br />na representação que nos concerne,<br />papel que nos foi entregue<br />por quem nos dotou de verve,<br />trejeito apropriado<br />para cada local, momento,<br />usando, com discernimento,<br />quando cordatos do que fazemos,<br />variados sentimentos,<br /><br />manifestos irreprimíveis,<br />sonantes, espalhafatosos,<br />não audíveis, maravilhosos,<br />confortos que nos consolam,<br />nos enobrecem,<br />assolam,<br />consoante ruínas que fazem<br />desgastes,<br />quando desfazem,<br /><br />dualidade que enlouquece,<br />alegria desmedida,<br />tristeza de qualquer vida,<br />ternura que dura,<br />perdura,<br />compaixão de quem muito sofre,<br />pitadas que nos deram<br />guardadas,<br />como num cofre,<br /><br />cerradas a sete chaves,<br />como cafres ciosos que esperam<br />por muito mais do que têm,<br />avaros,<br />sem entraves,<br />olhando para ninguém,<br />eremitas assumidos,<br />pretensos,<br />quando enormes, quando imensos,<br />incapazes de rir, chorar, gemer,<br />muralhas de aço, perante<br />gemidos,<br />dando, fazendo sofrer,<br />ignorando o degradante,<br /><br />doce afago se sente,<br />sorriso que aflora,<br />lágrima que desliza,<br />chora,<br />tremura que nos embala,<br />colo que alberga o Mundo<br />refúgio de tanta gente,<br />dor tamanha que esmaga,<br />compreensão que aglutina,<br />não dispersa,<br />fome que escandaliza,<br />riqueza que se desbarata,<br />prodigaliza,<br />inferno provocado pelo homem<br />horror que mata,<br />almas que se apagam,<br />somem,<br />quando disparam,<br />maltratam,<br /><br />súmula que me compõe,<br />alegria de quem se isola,<br />imaginação que tudo apaga,<br />loucura de quem procura<br />enclave miraculoso,<br />recanto maravilha,<br />num oceano, uma ilha<br />em que habito, em que ouso,<br />refugio do que me envergonha,<br />longe do malévolo,<br />peçonha,<br />busca da felicidade eterna<br />que comove,<br />tão terna,<br />que me une, me move!!!... <br /><br /><br />05<br /><br />repartem-se sentimentos <br />cantando distâncias <br />em lúcida loucura...<br />dividem-se sentimentos<br />algemando-se ângulos<br />em cavalos de fortuna...<br /> <br />e a/deus ternura...crivada de medos em estrelas puras.<br />e a/deus paixão... turbilhão emoção em puro algodão.<br />e compro_metida alegria todos te esperam no dia a dia.<br /><br /><br />06<br /><br />O caos a que me entrego<br />me renega.<br />A dor em que navego<br />aflige e cega.<br />Mas tudo se desfaz<br />em alegria<br />quando coração<br />vai pra frente,<br />volta atrás<br />e ternura,<br />mais que apenas dor,<br />inscreve-se com-paixão.<br /><br />Para mim, loucura é isto.<br />Criar a partir do caos.<br />Ser feliz na dor.<br />Ter coração.<br />Gritar até o último momento<br />(Ah! Eu protesto! Protesto!)<br />quando vencem os maus.<br /><br /><br />07<br /><br />enlouqueço de prazer<br />quando dás o corpo<br /> <br />e morremos<br />de prazer<br /> <br />na perfeição<br />de_ter a poesia feita...<br /><br /><br /><br /><br /><em>Índice de autores:<br /><br />01 – Sónia Regina<br />02 – Luís Monteiro da Cunha<br />03 – José Dias Egipto<br />04 – Manuel Xarepe<br />05 – Ísis<br />06 – Maria José Limeira<br />07 – Francisco Coimbra</em>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-54273603070773929272007-09-18T01:03:00.000-07:002008-12-10T19:10:24.269-08:00Mulher da Vida<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEghjWt5DWzmJh28jOmc0-_sKoUHRceS9SIJtKtDI00VqOZEBOVsJDMNU9HG3e5ciurjqNOFxkkfcot-wD8TMz0XAID7Wwnfeq_ihYQFvdq9VyzMa274zh0QG7j9HSpb3VmMWsonZQZHkbQ/s1600-h/Mulher+Sombra.gif"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEghjWt5DWzmJh28jOmc0-_sKoUHRceS9SIJtKtDI00VqOZEBOVsJDMNU9HG3e5ciurjqNOFxkkfcot-wD8TMz0XAID7Wwnfeq_ihYQFvdq9VyzMa274zh0QG7j9HSpb3VmMWsonZQZHkbQ/s320/Mulher+Sombra.gif" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5111454256064938834" /></a><br /><br />(Foto: autor desconhecido)<br /><br />Levanta mulher da vida<br />Tá na hora do trabalho<br />Hora de voltar pra lida<br />De quem rala pra caralho<br /><br />Te acusam de vida fácil<br />Falam mal do teu ofício<br />Fonte de prazer portátil<br />Que abastece todo vício<br /><br />Quem te vê rodar bolsinha<br />Na rua da Meretriz<br />Duvido que adivinha<br />Do que escapou por um triz<br /><br />Porque te perseguem mais<br />Do que à tua perseguida<br />Cafetão sempre quer mais<br />Policia cobra a batida<br /><br />Navalha na carne dói<br />Por isso não beija a boca<br />O preconceito corrói<br />Contudo, lhe tira a roupa<br /><br />Te xingam de vagabunda<br />Mulher perdida, rameira!<br />Quem não olha a própria bunda<br />Quer te botar na cadeia<br /><br />Mulher que dá sem vontade<br />Te iguala na profissão<br />Quem dá por necessidade<br />Não entra em contradição<br /><br />Se fosse universitária<br />Ou garota de programa<br />Já não seria gentalha<br />E muito menos piranha<br /><br />Fosse dona de bordéu<br />Não daria a tua buceta<br />Não viverias ao léu<br />Mendigando por gorjeta<br /><br />Seria até respeitado<br />O teu estabelecimento<br />Não venderia fiado<br />Nem faria abatimento<br /><br />Políticos e juízes<br />Comeriam na tua mão<br />Não haveriam deslizes<br />E nem ordem de prisão<br /><br />Mas quem milita na zona<br />Pelo pão de cada dia<br />Só usa roupa cafona<br />E não goza regalia<br /><br />Se a nossa sociedade<br />Não fosse tão desumana<br />Riria da falsidade<br />Não te poria na lama<br /><br />Mas quem come a tua carne<br />Cospe o prato em que comeu<br />E depois não faz alarde<br />Nem conta que te fodeu<br /><br />Vai chegando sorrateiro<br />Olhando sempre pro lado<br />Paga a conta do puteiro<br />E sai de lá abaixado<br /><br />Vaca, Vadia. Biscate<br />Michê, Quenga, Pistoleira<br />Vigarista, Vadia, Puta...<br /><br />Mulher à-toa?...<br /><br />Qual o quê!<br /><br />De todos os apelidos<br />Que pintam voce tão feia<br />O melhor que tenho lido<br />É o que te chama guerreira<br /><br />Quer saber?...<br /><br />Se durou mais de mil anos<br />E é a profissão mais antiga<br />Peço licença aos arcanjos<br />Vida longa às raparigas!<br /><br />Denilson NevesFilipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-47039511560017477462007-09-18T00:52:00.000-07:002007-09-18T01:01:53.585-07:00Entrevista a Sónia Regina*<div align="justify">por Vera Carvalho e Carlos Luanda<br /><br /><strong>1.Sonia Regina, quando e como despertou o seu interesse pela poesia?</strong><br /><br /><strong>Sonia Regina</strong> - A minha avó portuguesa me recitava inúmeras vezes a Nau Catarineta, eu adorava ouvir aquela história contada em versos e "via", junto com o gaijeiro, as "terras de Espanha, areias de Portugal!". Ela escrevia quadrinhas, me convocava para ver a forma nas nuvens, as folhas balançando ao vento. Minha mãe adora a natureza e fica embevecida com a beleza que há em cada coisa: o movimento do mar, a cor da grama e o cheiro da terra depois da chuva, o pôr-do-sol, as nuvens na montanha, a névoa na serra. Sempre nos chamou a percebê-la – a mim e ao meu irmão. Acho que foi assim que elas me despertaram a imaginação, cultivaram a minha sensibilidade e o interesse pela poesia – dita, escrita, vivida em cada coisa - , quando eu era criança. Mas ler poesia mais amiúde, procurar conhecer os poetas do mundo, das várias épocas, e escrever poemas, foi a partir de um projeto de poesia que desenvolvi com crianças de dez anos, em 1999. Fui procurá-los para apresentar a eles, incentivei-os a escrever. Eles criaram, e eu junto. Não parei mais.<br /><br /><strong>2. Como escritora e psicanalista é possível fazer-nos uma análise da sua relação com aquilo que escreve?</strong><br /><strong><br />Sonia Regina</strong> - É complicado a gente analisar uma relação nossa. Nem sei se, ainda que tentasse, não resultaria num apanhado de inferências, suposições. Mas posso dizer do que percebo, do que sinto.<br />Gostava de inventar peças de teatro – que encenava com os amigos -, quando era criança. Contos de fadas, princesas em vestidos esvoaçantes, histórias de amor.<br />Escrever sempre foi uma necessidade. Dos desabafos adolescentes passei a escrever crónicas e algumas narrativas em 1ª pessoa, ou em 3ª pessoa. Não me agrada criar personagens ou escrever diálogos, acho que por isso nunca escrevi um conto, ou um romance.<br />Sempre escrevi por prazer, escrevo quando tenho vontade. As listas me ajudam a dar um ritmo, mas não me obrigo. Passei um período ultimamente em que precisava escrever todo dia. Às vezes dois poemas por dia. Mas não penso sobre isso, escrevo e pronto.<br />O que não gosto, jogo logo fora. Só dou título se acho que o poema é bom – ou razoável - e não tenho escrito prosa, a não ser alguns ensaios, de estudo.<br />Não costumo ficar relendo o que escrevi, embora eu o faça quando visito o Espaço Aberto do Joaquim Evônio e o meu blog: acho-os bonitos, estar por ali é relaxante.<br />Na prosa eu penso, pra escrever, na poesia não. Não escrevo mandando recados, nem em poemas do amor eu o faço. Tampouco escolho um tema. O poema acontece em mim, às vezes a partir de uma frase que escute ou leia. Às vezes de uma palavra, às vezes de uma imagem. Anoto em qualquer papel e já tive um caderninho dentro da bolsa, o "Dolores Duran"(é o nome de uma antiga poeta-letrista, famosa por aqui – que tinha um) para ir anotando coisas que me surgiam. Já aconteceu de eu acordar no meio da noite com um poema pronto dentro da cabeça. Se não levanto pra escrever, depois esqueço. Não acho que seja um transe, como se achava dos poetas da antiguidade. Acho que é uma vocação, talvez um dom. Um mistério. É uma voz íntima que quer dizer o que nem sempre conheço – ou reconheço. E eu deixo-a falar.<br /><br /><strong>3. Qual a sua intenção ao criar o conceito "Laboratório da Palavra" e por conseguinte a revista digital?</strong><br /><br /><strong>Sonia Regina </strong>- O conceito foi formulado a posteriori. Nos laboratórios da palavra trabalha-se com a palavra e a imagem, são oficinas de escrita criativa. Verifiquei que se consegue expressar muito dos sentimentos alocados na carne e na alma, alinhavados ou tangentes, utilizando a imagem. Ela incentiva e ajuda na composição, quando a palavra é insuficiente. Na revista digital divulgamos essas expressões publicando os novos autores e a expressão universal, esta através da poesia de autores de vários países. Nos laboratórios da palavra trabalha-se com o mistério, a paixão, o amor, o ser, tudo... e nada.<br /><br /><strong>4. Na "Laboratório da Palavra" e no "No fluir da metonímia", há uma união entre o áudio visual e a literatura. Você acha que há a necessidade de usar outros recursos além da linguagem verbal para fazer poesia?</strong><br /><br /><strong>Sonia Regina</strong> - Não, não acho necessário. É que tento ir além da palavra. Nem sempre a palavra diz do que quero expressar e a imagem ajuda a compor. É como diz a Clarice Lispector, a música e a pintura têm mais possibilidades de criar os seus elementos. Pode-se criar um pigmento de um tom ou cor inexistente; uma suite, uma rapsódia, um arranjo jazzístico. A literatura tem palavras pré-existentes.<br /><br /><strong>5. Colaboradora em workshops e palestras no Brasil, Sonia, qual a sua visão de "Escrita Terapêutica"?</strong><br /><br /><strong>Sonia Regina</strong> - Terapêutica, não psicoterápica. Não é um objetivo nem uma questão de catarse, de despejar algum acúmulo emocional, embora no consultório – com ajuda de um psicoterapeuta menos ortodoxo - se possa usar a escrita como meio auxiliar, mesmo Freud relata casos assim. A escrita terapêutica à que me refiro diz respeito ao resultado da escrita: no depois se verifica que fez fluir algo que estava intimamente obstruído. O escrever organiza. Uma vez dita, a coisa se inscreve, se significa e re-significa, ganha corpo e expressão concreta. Penso que através da escrita alguns `nós' interiores podem ser desatados, ou elaborados.<br /><br /><strong>6. Sonia, ao ler-te tenho sempre a sensação de sentir-te as construções das palavras como elementos de delicadas filigranas. Peças que dizem tudo pela arte de capturar os espaços através da nobreza que os emoldura em estruturas de elegância e que lhes confere luz, brilho e volume. Nunca tens a sensação que um poema possa implodir sob a sua aparente fragilidade, ou é mesmo esse desafio uma das tuas motivações?</strong><br /><br /><strong>Sonia Regina</strong> - Respondo não às duas. Meus poemas não são contidos por mim. Sei que sou vulcânica, mas entro em erupção normalmente. Ou seja, tudo meu é intenso – sou alegre, triste, amo, odeio, me deslumbro com as coisas, tudo intensamente - e penso que isso se reflita nos meus poemas. Se alguns são doces, é porque sou mesmo meiga e afetuosa. Minha delicadeza não vem de uma fragilidade e sim de uma gentileza que me agrada. Não sou rude, a não ser que me invadam, façam alguma injustiça ou maltratem quem eu gosto: aí fico irada e sei que minha palavra fere intencionalmente, mesmo os mais fortes. Mas com leveza, sem ironia ou rispidez. Há alguns poemas que escrevi assim.<br />O que me desafia são as causas dadas como perdidas, algumas vejo refletidas nos poemas. E o que me motiva é a paixão: tenho que estar apaixonada sempre, ou por alguém ou por uma idéia, ou por uma atividade – profissional ou não. Às vezes se reflete nos poemas, às vezes não.<br />Na verdade, é o poema que me respira e eu...Bem, acho que esta foi a melhor descrição que já fizeram de mim: "Poeta por vocação, psicanalista por paixão, mãe por amor, mulher do mundo por missão, artista por mistério…"<br /><br /><strong>7. Se por mera hipótese nos víssemos de repente a viver num mundo sem o conceito de poesia, como pensas que seria encarado alguém cujo olhar a inventasse?</strong><br /><strong></strong></div><div align="justify"><strong>Sonia Regina </strong>- Olha, ontem mesmo uma pessoa com quem conversava, ao saber que eu era psicóloga, disse (sorrindo) que todo `psi' é doido. Quando eu disse que era poeta, aí é que riu mesmo. Não acredito que houvesse mudança, penso que a história se repetiria. O poeta é mesmo estranho, às vezes é um bom espelho, às vezes incômodo. Geralmente produz perplexidade, estranheza. É desconhecido e enigmático. Tem um olhar diferente, por vezes contacta o Belo e geralmente toca os corações. Só que na antiguidade o poeta era visto como o que acessava o passado, escrevia em transe a partir do contato com os deuses. Tinha tanto respeito e valor quanto os oráculos, que acessavam o futuro.<br /><br /><strong>8. Achas que ser poeta é um privilégio, uma iluminação, ou é uma predestinação maldita?<br /><br />Sonia Regina</strong> - Acho que nenhum dos três. Mas penso que já comentei bem acerca disso, anteriormente.<br /><br /><strong>9. Dada a tua formação académica multi-facetada e especializada em áreas complexas do infinito interior humano, e dado que transportamos toda a carga de conhecimentos em tudo o que fazemos, que perigo (ou não) sentes de puderes deixar escorregar o teu dizer poético para o hermetismo?</strong><br /><strong><br />Sonia Regina</strong> - Acho que todo o perigo, mas não só pela minha formação. Sou uma pessoa comunicativa, simples, faladeira; e ao mesmo tempo tímida – sei que por vezes pareço antipática. Sou reservada por natureza, embora gostem da minha companhia alegre. Sei exercer a autoridade, tenho boa auto-estima, sou completamente independente mas adoro a proteção e o cuidado masculinos. Não sou previsível, acho que sou meio paradoxal. Se eu sou por vezes não-compreendida, como não acontecerá com a escrita? A minha prosa tem poucos fatos, o que a torna, por vezes, hermética. A poesia corre o mesmo risco. Que fazer? Andei dizendo que queria que o açougueiro da esquina se emocionasse com o que escrevo, e andei tentando mudar o jeito de escrever. Deu-se um branco. Tenho que me satisfazer se conseguir chegar ao seu coração, ainda que não entenda uma ou outra palavra, ou não compreenda do que falo. É como diz Herberto Helder:<br /><br />"Um poema cresce inseguramente<br />na confusão da carne,<br />sobe ainda sem palavras, só ferocidade e gosto,<br />talvez como sangue<br />ou sombra de sangue pelos canais do ser. (...)"<br /><br /><strong>10. Olhando para trás, e recapitulando com um olhar crítico mas duma forma genérica, que poemas te arrancaram os pedaços da alma com que os escreveste e que poemas não escreverias?</strong><br /><br /><strong>Sonia Regina</strong> - Um em especial me "arrancou pedaços da alma", chamado "Assinatura". E mais três: "Grito" *, "Reforma Agrária" *, "Jardineiro da Vida". Muitos do amor, uns eróticos, mas como referi-los todos? Refiro um que fala do amor por tabela, diz da saudade de certo tato: "Navega o lápis a memória do tato" *.<br />Não escreveria "quando chovo no mar" – acho-o horrível – nem "o olhar sensível toca o solo, reverso" – não entendo nada do que lá está escrito.<br /><br /><strong>11. Por último, e agradecendo o tempo dispensado, gostaria dumas palavras breves, e como sempre especiais, do teu pensar para todos os colegas e amigos da lista. Obrigado mais uma vez.</strong><br /><br /><strong>Sonia Regina</strong> - Agradeço o "como sempre". Esta especialidade – se há e aparece – deve-se à especialidade desta lista, dos companheiros, do clima. Sinto-me completamente à vontade para ser aqui do jeito que sou e sempre tenho a sensação de acolhida, com qualquer humor ou expressão na palavra. Isso é bom. O jeito simples e cordial também me agrada, até o jeito de se discutir: as diferenças são respeitadas. Lamento é não comentar ninguém e me sinto em falta. Mas é um princípio que teria que rever: como não dá pra comentar muitos, não comento nenhum. E os que são lidos ficam sem saber.<br />Bem, obrigada pela oportunidade e pelo trabalho: percebe-se que houve muito, para me apresentar essas questões magníficas, que me laçaram completamente. Foi um imenso prazer respondê-las, desculpem-me se me estendi. Parabéns aos dois.<br /></div><div align="justify"></div><div align="justify"><br /><br />* Sonia Regina é o nome literário de Sonia Regina Campos, carioca, escritora, psicanalista e professora. É aluna do Programa de Pós-Graduação em Literatura da UERJ, onde se especializa em Literatura Brasileira. Exerce a psicologia para o Estado do Rio de Janeiro, tendo sido licenciada pela PUC/RJ e pós-graduada pelo Instituto de Psiquiatria/UFRJ.<br />É a editora responsável pela revista digital Laboratório da Palavra, que fundou há 6 anos, onde divulga a poesia universal e publica novos autores. As atividades de produção e criação de multimídias unidas à literatura lhe propiciaram verificar outra linguagem do subjetivo, que originou o projeto de pesquisa "Habitações Poéticas do Teatro: Cenários e Escrita Dramática".<br />Tendo criado o conceito "Laboratório da Palavra", coordenou cursos de formação e grupos de estudo e criação de texto que associam a palavra à imagem; proferiu palestras e workshops no Brasil, em Portugal e no Uruguai, onde também apresentou o trabalho "Escrita Terapêutica" - de sua autoria -, no 4º Encuentro Internacional Literario Abrace – Solidariedad entre Creadores.<br />Em novembro de 2001 foi a Montevidéu – como convidada internacional da Mesa Redonda `Ciclos Literários", do Movimento Abrace – para proferir comunicação científica sobre a investigação que realizava no Centro Psiquiátrico Rio de Janeiro com pacientes do hospital-dia, na Oficina da Palavra que coordenava. Essas produções originaram o livro Ser poeta é se viver e foram objeto da matéria publicada por Artur Dapieve no Jornal O Globo, disponível no endereço:<br /><a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.geocities.com/laboratoriodapalavra/COLUNA-DAPIEVE.htm" target="_blank">http://www.geocities.com/laboratoriodapalavra/COLUNA-DAPIEVE.htm</a><br /></div><div align="justify">Foi uma das diretoras do <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.terravista.pt/MeiaPraia/2154" target="_blank">Grupo Cultural Contraponto</a> - produtora de eventos culturais, cursos, sites e revistas virtuais - e co-fundadora da editora <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.letraecia.com.br/index1.htm" target="_blank">Letra&Cia</a>.<br />Integra os Grupos de criação e discussão literária do YahooGrupos: Amante das Leituras, Netpoema e Encontro de Escritas, em cujas antologias consta.<br />Lançou em Portugal e no Brasil Uitzilim Poemas e Laços y Lazos - Manual de Escrita Criativa, este em co-autoria.</div><div align="justify">Apaixonada pela poesia - antes de tudo poeta -, tem seus trabalhos publicados na web nos endereços:</div><div align="justify"><span style="font-size:85%;"></span><span style="font-size:100%;">- No fluir da metonímia – Poemas (blog pessoal) </span><a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://sregina.zip.net/" target="_blank">http://sregina.zip.net/</a><br />- Varanda das Estrelícias - Espaço Aberto <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.joaquimevonio.com/espaco/sonia_regina/soniaregina.htm" target="_blank">http://www.joaquimevonio.com/espaco/sonia_regina/soniaregina.htm</a><br />- Mundo do Poeta - <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.mundopoeta.net/autores/sonia_regina.htm" target="_blank">www.mundopoeta.net/autores/sonia_regina.htm</a><br />- Dubito Ergo Sum – Site Cético de Literatura e Espanto <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum/1indfic.htm" target="_blank">http://paginas.terra.com.br/arte/dubitoergosum/1indfic.htm</a><br />-Revista Digital Laboratório da Palavra <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://br.groups.yahoo.com/group/laboratoriodapalavra" target="_blank">http://br.groups.yahoo.com/group/laboratoriodapalavra</a><br /><br />*grito<br /><br />Eu, por mim, não dou nada<br />tomo, pego, arrebato<br />devolvo cada mau trato<br />fico é fortalecida<br />a cada farsa, mentira<br />cada punhalada cravada<br />me lança numa jornada<br />teimosa, vou à batalha<br />resisto, não quero ser pária<br />afio minha navalha<br />encaro toda desdita<br />transformo a vida diária.<br /><br />*<a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www/" target="_blank">http://www/</a>.casadobruxo.<a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://com.br/poesia/" target="_blank">com.br/poesia/</a>s/reforma.ht<br /><br />* Navega o lápis a memória do tato<br /><br />Navega o lápis a memória do tato, estremece<br />na ponta dos meus dedos, oferece-se ao ato<br />numa respiração acelerada<br /><br />ama-me e me despe de toda civilização<br /><br />sou já poema, versos que ardem<br />escritura da saudade num papel<br />sem linha, regra, lei ou margem<br /><br />Sonia Regina </div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-30366814758076351952007-09-17T06:05:00.000-07:002008-12-10T19:10:24.422-08:00Devia ser Natal<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg7wcvbdtuxCo1ShyIh-qqcC8yBi3XGnp8ANUKesizMuD6CBrqEMZvbcegdwchaiNvpN66148EfAhEQtXEXP4DdugCG6zEQeUMQIfJ_VDnsF8mj-wvWXmgLeJUuNBKBJao_S1EpEAetMy0/s1600-h/Mãos,+piano,espanada.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5111160755179799362" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg7wcvbdtuxCo1ShyIh-qqcC8yBi3XGnp8ANUKesizMuD6CBrqEMZvbcegdwchaiNvpN66148EfAhEQtXEXP4DdugCG6zEQeUMQIfJ_VDnsF8mj-wvWXmgLeJUuNBKBJao_S1EpEAetMy0/s320/M%C3%A3os,+piano,espanada.jpg" border="0" /></a> Foto: Bruno Espanada<br /><br /><br /><div align="justify">de Jorge Casimiro<br /><br /><br />Vejo o teu retrato ao piano. Devia ser Natal. A tua mão pousa no recato do teclado enquanto tu posas para o magnésio à la minuta da máquina fotográfica com um olhar vivo de menina feliz. Longos cachos de cabelo encordoado escorrem-te pelos ombros frágeis. E chega-me um som sustenido da memória sépia desse momento longíssimo.<br /><br />Afasto-me uns passos. Fecho os olhos. E revejo a cena a que nunca assisti. A família reunida em teu redor, como se tu fosses o centro de um pequeno mundo. Suspensos todos do teu talento precoce. Devia ser Natal. Havia ainda presentes por abrir junto à grande boca da chaminé, onde um fogo luminoso consome troncos geométricos com uma voracidade aconchegante. Uma cadeira de baloiço voga lenta em contraluz, tripulada a compasso por uma silhueta esguia e escura.<br /><br />Ouvem-se palmas carinhosas. Deves ter terminado mais uma peça. Talvez Chopin. Há um faiscar trémulo de velas nos cristais da mesa, posta a preceito para a solenidade ritual de mais uma reunião familiar. Devia ser Natal. Avós, irmãos, pais, tias, primos distantes. Seríssimos senhores de fartos bigodes aristocraticamente retorcidos e encerados. Penteados de risca ao meio esculpidos a rigor e brilhantina. Senhoras assertoadas numa elegância démodée. Crianças aquietadas com severidade para o enquadramento estático da objectiva... Todos aqueles rostos desconhecidos que percorro em velhos álbuns fotográficos herdados já não me recordo de quem. E o cirandar atarefado de um exército de criadas engomadas de folhos de renda branca sobre o negro impecável das fardas. Trazendo e levando terrinas e travessas, pratos e porcelanas. Para que tudo saia perfeito. Devia ser Natal. Para que tudo fique memorável; no registo eterno de mais um retrato de família que sobreviverá a todos, no seu esmaecer lento. Para ser contemplado com uma curiosidade indiferente por perfeitos desconhecidos que virão do futuro. Desconhecidos como eu, que olho o teu retrato ao piano em pose para o passarinho que te trará até mim, sem que tu o saibas ou possas sequer suspeitar. Se não, talvez até me acenasses com essa mão delicada e pálida que pousas no colo com a serenidade afirmativa de quem confia no futuro. Sem te dares conta de que o futuro é tão transitório como tu ou eu, ou este retrato antigo em que os meus olhos tropeçaram por acaso. Porque o acaso é o verdadeiro futuro de todos nós. Um futuro de Natais sucessivos. A engordar compassadamente álbuns e álbuns de retratos com sorrisos e inocências de criança.<br /><br />E neste meu futuro solitário, ponho um disco a rodar na aparelhagem: um coral qualquer de vozes infantis e piano em fundo. Recosto-me no meu sofá preferido, afundando-me lento de torpor em longas fumaças de cachimbo. Devia ser Natal. Acaricio o teu retrato ao de leve, uma última vez. Com a timidez fugidia de quem devassa um tempo alheio, desbotado. Num gesto sussurrado, cúmplice. Como quem combina um segredo.<br /><br />Fecho cuidadosamente o álbum no vermelho frágil da capa com vestígios mínimos de letras a ouro, e volto a depositá-lo no fundo da arca onde te encontrei por acaso. E no silêncio da neve lá fora, a embalar a noite com o seu algodão, tu acenas-me suavemente, reveladora. Como quem segreda um futuro. </div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify"></div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-31627439702262604302007-09-17T01:43:00.000-07:002007-09-17T01:44:52.139-07:00IlusãoQuem já pisou a linha do horizonte?<br />Quem pensa,<br />iludido na cegueira do sol pôr, <br />alguma vez ter amado?<br />O amor é inatingível, <br />uma quimera escorrendo entre os dedos em areias e ilusão.<br />Sempre que alguém pense te-lo encontrado, <br />mesmo se pousado na palma da mão, <br />não o consuma.<br />Ele desfaz-se <br />no pó do nada <br />de que é feito a nau do desejo à chegada.<br />Afinal, <br />apenas a viagem importa <br />e o amor fica já ali <br />onde o sol em chamas,<br />numa linha eterna <br />dum verso por terminar, <br />nos chama.<br /><br />Carlos Luanda<br /><br /><br /><em>Análise Crítica<br /><br />Este texto "Ilusão", de Carlos Luanda, é um verdadeiro achado na <br />internet, oásis onde a gente pousa para matar a sede, num tempo de <br />aridez e terra calcinada... Aparentemente lugar-comum, porque trata <br />de "amor" (e este tema já foi explorado a mais não poder por vários <br />autores - velhos & novos - o texto empresta um novo enfoque ao <br />assunto.... <br />E vamos encurtar a história:<br />Trata-se do fugaz, do que antes de ser já era, do que pensa que é <br />presente e já passou, da "ilusão" de quem sonha alguma coisa, e é <br />outra completamente diferente porque já se consumiu (se consumou?) <br />em chamas e agora é cinza.<br />Vive-se porque se vive.<br />Ama-se porque se ama.<br />É um texto Poesia, do primeiro ao quinto, e estamos conversados.<br />"Bem haja!", como dizem os portugueses.<br />"Carago!", como bem diz Ana Maria Costa. <br />"Saludos!", digo eu, ao autor de tão belo poema.<br /><br />(Maria José Limeira é escritora e doce jornalista democrática de <br />João Pessoa-PB)</em>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com4tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-51502368304047635692007-09-12T01:35:00.000-07:002008-12-10T19:10:24.624-08:00"A casa é sempre o lugar certo de peleja",de José Dias Egipto, in " A Casa"<br /><a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEitzlksUQeINohgWrA40a5zmOtAtZuOYoSEnvczm0QN5OlSfV232y-pCbIHYfMeTujDo83MMd9NGvFK60vx7jYGDZrTE2ZH4c2B20VRdqHCTWnbhKwBLuT0rX8dLeD3Nia5xMD1QL6qp80/s1600-h/House.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5109596536680530722" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEitzlksUQeINohgWrA40a5zmOtAtZuOYoSEnvczm0QN5OlSfV232y-pCbIHYfMeTujDo83MMd9NGvFK60vx7jYGDZrTE2ZH4c2B20VRdqHCTWnbhKwBLuT0rX8dLeD3Nia5xMD1QL6qp80/s320/House.jpg" border="0" /></a>(Foto: autor desconhecido)<br /><div></div><div><br /><br />01 </div><div><br />Sou dos dias antes das estrelas.<br />Desses tempos do Nada eterno.<br />De onde surgiu o fino fermento,<br />que cozeu no mundo<br />o forno do Tempo.<br />E continuo sempre nada.<br />sem sois ou luas que me invadam<br />Não viajo, não resido,<br />não existo, nem me invento.<br />Não sei o que é um tormento<br />nem de estar preso em parte alguma<br />E sendo menos do que a ausência<br />que se perde no infinito.<br />É disto mesmo que preciso.<br />Desta paz dum mal que não sinto.<br />E onde moro; a minha casa...<br /><br /><br />02<br /><br />… encontramos<br />no íntimo, o que buscamos,<br />faminto que procura no lixo,<br />resposta para tanta pergunta que assusta,<br />aviltação que sinto por isso,<br />sombra abrangente que obscurece a razão,<br />temerosa dúvida que se tem,<br />não busca,<br /><br />ludibria quem se alheia,<br />beneficia quem se preocupa,<br />nisso se ocupa,<br />inocente que morre na hecatombe,<br />casa de cada um, peleja constante,<br />mausoléu que cerra horizonte,<br />mágoa,<br />desconforto de quem sente<br />inquietação,<br />acomodação do indiferente,<br />situação degradante,<br />aberrante,<br />como manchas que alastram,<br />escuras, lodosas, espessas,<br />matéria do ventre da Terra,<br />líquido maldito, putrefacto,quando se retira,<br />terra de ninguém, desacato,<br />desterra,<br />acondiciona como espécie rara,<br />energia cumulativa de milénios,<br />envolvimento soterrado,<br />enriquecido,<br />razão primeira, coisa cara,<br /><br />base que sustenta,<br />destrói,<br />constrói<br />impérios que soçobram perante morte<br />consentida,<br />fortuna colossal que amedronta,<br />lama que se transforma,<br />situação descomunal que afronta,<br />nódoa que ostenta, como sorte,<br />sem destino, como norma,<br />energia temida,<br /><br />devastação com que deparamos,<br />quando olhamos,revoltamos<br />na sanha que usamos,<br />quando travamos luta incerta, injusta,<br />celestial, puro,<br />causticando vítimas inocentes,<br />rochedo imponente, bem duro,<br />enfrentando o que nos assusta,<br />proveitos,<br />dispêndios connosco, com outros,<br />pobres loucos,<br />matéria infecta,<br />dinheiros, regalias,<br />ilusões, fantasias,<br />obcecações,<br /><br />sussurros, segredos,<br />medos,<br />conluios, conspirações,<br />degredos,<br />suspiro de quem se julga longe disso,<br />inferno a seus pés,<br />afago sem agasalho,<br />confissões, plegarias, fés,<br />resultado da cegueira colectiva,<br />quando se invectiva,<br /><br />acirra<br />na mentira,<br />degradação que nos transtorna<br />o juízo,<br />luta contínua, desigual<br />entre o bem, o mal,<br />divina ceia de quem se banqueteia,<br />negridão que avassala,<br />escravização de quem se desfeia,<br />confunde espírito mais daninho<br />como embriagado por vinho,<br />empedernido ser translúcido,<br />pesado, grosso,<br />rude desgosto<br />com que me igualo<br />quando calo,não me insurjo!!!...<br /><br /><br />03<br /><br />cada viagem ao berço será<br />sempre o início do regresso<br />o retrocesso na peleja dos olhos<br />travessos como a aragem<br /><br />cavalgar cada praça no pau<br />da existência da vassoura<br />a excomungar uma limpeza<br />de ideias que não se desejam<br /><br />caravelas ainda velejam nos rios da infância<br />correm de novo para os campos sedosos<br />de tubérculos e caules dos milharais<br />onde criança erigia-se a casa ruidosa<br />sob as bandeiras que eram douradas<br />sobrevoadas por aviões de asas<br />recortadas nos gritos constantes<br />dos temerosos animais<br /><br />O lugar certo<br />da peleja<br />habita no coração<br /><br /><br />04<br /><br />entre o que sei e o que não digo<br />ponteiam súbitos de serenidade<br />entre o que não sei e o que digo<br />cravam-se abismos de vaidade<br />fico-me pelo pudor do silêncio<br />que sufoca a peleja acesa<br />de bocas soberbas<br /><br />05<br /><br />por isso, deixem-me enxergá-la.<br />deixem-me ver, na minha casa,<br />tudo que de tão meu ela guarda<br />porque<br /><br />"Guardar uma coisa é<br />olhá-la, fitá-la, mirá-la<br />por<br />admirá-la, isto é,<br />iluminá-la ou ser por ela<br />iluminado"<br /><br /><span style="font-size:78%;">(1)(1) António Cícero<br /></span><br /><br />06<br /><br />Em casa sou asa<br />Em caso que eleja<br />Peleja e litígio<br />Inseto de frutas<br />Quintal de palavras<br />Sou lavra de larvas<br />Minhocas, lampejos<br />Prego percevejos<br />Ampulheta, paráfrase<br />Parafuso difuso<br />Alicate abacate<br />Sabor enjambrado<br />Por sal e açúcar<br />Extraio das sobras<br />De sombras profusas<br />A seiva do novo<br />Reciclo o telhado<br />Espatifo as viga<br />e me recolho lenha<br /><br /><br />07<br /><br />na segurança do lar<br />têm lugar as grandes pelejas<br />servidas pela pele<br />tendo o corpo por bandeja<br />saber ao certo...o deserto pelas dunas<br />correndo o vento<br />em companhia ao pensamento<br />porque o que sei<br />diz-me ser de súbito apenas<br />o repente a decidir<br /><br />o que é certo<br />tendo por errado o contrário<br />enquanto as palavras...<br />valem o que vale(m) tudo<br /><br /><br />08<br /><br />Diversas pelejas<br />assumem contornos de luz<br />quando procuramos no lar<br />que existe dentro de nós<br />e deixamos nas noites a voz da pele<br />para entregarmos às manhãs<br />o beijo fresco da paz.<br /><br /><br />09<br /><br />É em casa que guardo todas as minhas pedras<br />dentro dos livros de oração.<br /><br /><br />10<br /><br />Dentro de velho livro,<br />rato sorrateiro e teimoso<br />come e bebe as mais belas<br />palavras de amor<br />que escrevi para alguém<br />que não me quis.<br /><br />Na casa soturna e abandonada,<br />esse ratinho treloso<br />é o momento alegre<br />da mais triste história<br />de amor que então vivi...<br /><br />11<br /><br />A casa que não tenho<br />é a casa que desejo<br />porque a que possuo<br />nada dela almejo.<br />investi todo meu amor<br />na casa que construí,<br />meu sangue, minha dor<br />meu suor fiz cair,<br />mas pretendo outras casas<br />em estado de construção<br />para fugir desse marasmo<br />do dia a dia, pão e pão.<br />Construirei o palácio dos sonhos<br />e a vida terá continuação<br />construirei na verdade<br />sem alicerce no chão<br />o palácio para a posteridade.<br /><br /><br />12<br /><br />Outra vez a casa…<br />O tumulo inconfesso<br />da nossa vida a sós;<br />o regresso sempre imaginado<br />ao lado mais uterino de nós…<br /><br />Outra vez o quarto, a sala,<br />o cheiro das roupas penduradas,<br />os lugares da alegria e do pranto;<br />fragrâncias de momentos do tempo,<br />carne nossa, partilhada, que jaz em cada canto…<br /><br />De novo os livros que forram as paredes,<br />nossos íntimos horizontes,<br />uma outra pele lisa, amarelecida e calva;<br />aconchego e luxúria do espírito,<br />rede, tantas vezes, que nos prende e que nos salva…<br /><br />Tirem-me tudo da vida que eu aguento!<br />Mas deixem-me ouvir os sons da casa,<br />a música e as vozes do meu jardim partilhado.<br />Porque sem esse unguento de luz e de gente<br />ficarei cego e gélido mesmo no calor da maior brasa!...<br /><br /><br /><br /><br /><em>Índice de autores:<br /><br />01 – Carlos Luanda<br />02 – Manuel Xarepe<br />03 – Luís Monteiro da Cunha<br />04 – Vera Carvalho<br />05 – Sónia Regina<br />06 – Rogério Santos<br />07 – Francisco Coimbra<br />08 – Ísis<br />09 – Ana Maria Costa<br />10 – Maria José Limeira<br />11 – José António Silva<br />12 – José Dias Egipto<br /></div></em>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-75458693456606095502007-09-05T01:33:00.000-07:002008-12-10T19:10:24.808-08:00"A seiva borbulha a cada acorde",<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjiFTGKVklOn_9K9ROdBWuTLYv3q5nwRkuNtLLeUzGK0NJxgKRRNVxnuHxGmInoupGjFrrnEl00n2XprSpFVHq8_REP47h77u_Eb-CzJmLQ4CLKZRM0l5KjsfDlkwXYbJ_f9ceTZBi45WE/s1600-h/Flor+de+Outono.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5106636749810383778" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjiFTGKVklOn_9K9ROdBWuTLYv3q5nwRkuNtLLeUzGK0NJxgKRRNVxnuHxGmInoupGjFrrnEl00n2XprSpFVHq8_REP47h77u_Eb-CzJmLQ4CLKZRM0l5KjsfDlkwXYbJ_f9ceTZBi45WE/s320/Flor+de+Outono.jpg" border="0" /></a><br /><div>de Sónia Regina, in "uma flor no outono"<br /></div><br /><div><br />01<br /><br />trago dentro de mim, um horto<br />onde cultivo minhas flores<br />onde colho meus próprios frutos<br />onde ouço o canto dos pássaros<br />onde caminho nos finais de tarde<br />onde transito pela seiva de acordes<br />entre tantas e generosas árvores<br />que abrigam com boas sombras<br />as borbulhas úmidas do chão de terra<br />onde o tempo deposita cada folha<br />num abraço outonal afetivo<br />no ciclo das quatro estações<br /><br />alheio aos alardes acachapantes<br />dos que propagam flores de plástico<br />emblemático e precioso resplendor<br />na contramão da nespereira florida<br /><br /><br />02<br /><br />… poalha perfumada se espalha<br />na atmosfera,<br />inumeráveis insectos embriagados<br />zumbindo em afazeres continuados,<br />levando pólenes, recanto da terra,<br />originando tais resultados,<br />poisando nas rosas que se erguem nos pedúnculos,<br />receptáculos sedosos das pétalas que têm,<br />gotículas minúsculas, dispersas, compostas,<br />pequenos cristais brilhando, crepúsculos,<br />arrumadas, abertas em chama,<br />cor que canta, beleza que clama<br />sente-se o borbulhar da seiva que ascende<br />do solo, a humidade que vem,<br />naquele vale sombrio, coberto de musgo,<br />ligeiro lusco-fusco,<br /><br />parpadeante nas costas do Outono,<br />plantas que robustecem<br />ao longo do dia,<br />perfeita harmonia,<br />seus ramos são galhos fortalecidos,<br />herbáceos viçosos, escorreitos até,<br />mantendo-as de pé,<br />milagre tão belo,<br />se apaga num dado instante,<br />renuncia do que foram, loucura, capelo,<br />período mais degradante,<br /><br />descaem-lhes cabeças, recolhem desvelos,<br />resguardam segredos,<br />respeitam, sentem medo,<br />fecham-se um pouco na seiva que passa<br />lhes chega o sossego,<br />borbulham mansinho<br />seguindo caminho,<br />perdendo seu viço, desmaiando, sem graça,<br />na noite que cai,<br /><br />sorrindo, adormeço,<br />aguardo, ansioso, retorno da cor,<br />num raio de Sol, energia, vigor,<br />consumação, enfeite, reinício, alvor!!!...<br /><br /><br />03<br /><br />acordes imprevisíveis, como um jazz,<br />pairam sobre ponte que se sustém<br />sobre o abismo do esquecimento<br /><br />não há memória de solidão na flor do outono<br /><br />escorre a seiva, magma dos sentidos,<br />e se adere à pele branca do meu corpo<br />novo de fruto<br /><br />no tempo perdido dos dias em branco<br />ficou a pele ressequida, comprometida<br />com o medo do brado dengoso das folhas<br /><br />canto de sereia a disputar as noites idas,<br />ruído enganchado num passado que maldigo<br /><br /><br />04<br /><br />Sons...<br />esses perdidos.<br />Escondem solidões com ruídos.<br />Desejos com gritos<br />E gritos com as seivas dos corpos,<br />Malditos!<br />Quero só o silêncio sem sentido.<br />Calado e quieto<br />Como uma nesga de céu<br />Embrulhado numa asa<br />em cima dum ramo dormindo.<br />Ouvem a escuridão que digo?<br />Não é preciso.<br />A solidão contenta-se com os acordes<br />de nenhum som ter conseguido.<br /><br /><br />05<br /><br />Há um grito imanente.<br />que jorra insubmisso<br />em cada corpo e acorde<br />borbulha o compromisso<br />uma seiva tangente<br />que indiferente morde<br /><br />não morre se sente<br /><br /><br />06<br /><br />ao ressoar meus passos<br />nos cantos nesta selva de concreto<br />ouço teu canto como salvação a minha pele ressequida<br />sobre os esquecimentos do tempo a roçar a ferida<br /><br />calço o sapato do infortúnio<br />busco a flor que dos teus olhos<br />me darás descanso repouso e guarida<br />a "esta seiva que borbulha a cada acorde"<br />de seu canto, minha doce amiga querida<br /><br /><br />07<br /><br />Em cada pensamento em gestação<br />em cada poema em formação<br />buscas linguagem, na chocadeira<br />traçando planos para a vida inteira<br />e o poema depois de gerado<br />traz um destino temperado e<br />depois que o poeta se recolhe<br />a seiva borbulha em cada acorde<br /><br /><br />08<br /><br />há um aroma de frutas no cálice aberto<br />da flor no outono e há a palavra branca<br />que no meu poema sorri, a cada acorde<br />da umidade<br /><br />jorro insubmisso à revelação impossível<br />as sílabas rodopiam, folhas<br /><br />lábios felizes, ardentes, a murmurar<br /><br /><br />09<br /><br />uma flor de outono na boca branca<br />branca a flor, branco o outono<br />em todas as cores da seiva branca<br />meu branco de palavras, palavra<br />pedra, palavra flor, nu e pobre<br /><br /><br /><br /><em>Índice de autores:<br /><br />01 – Rogério Santos<br />02 – Manuel Xarepe<br />03 – Sónia Regina<br />04 – Carlos Luanda<br />05 – Lmc<br />06 – Osvaldo Pastorelli<br />07 – JASilva<br />08 – Sónia Regina<br />09 – José Gil </em></div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-37683174962078204202007-08-28T01:57:00.000-07:002008-12-10T19:10:25.042-08:00"Libertos, há cavalos no vento."<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg8yYoCk6dQPmwiBTKHq4EHSRJTru_Ysqsr-VW0R2lTtpdJptUCsayGIMxVhmDb8QJSexxOjOfusVM9z6zkCHHI4Z1AuLP1raq3jwnZaF8mNs82MOj7mXsDzRdQcHrP_WTMEQ8Jl4ddU44/s1600-h/Horse_300.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg8yYoCk6dQPmwiBTKHq4EHSRJTru_Ysqsr-VW0R2lTtpdJptUCsayGIMxVhmDb8QJSexxOjOfusVM9z6zkCHHI4Z1AuLP1raq3jwnZaF8mNs82MOj7mXsDzRdQcHrP_WTMEQ8Jl4ddU44/s320/Horse_300.jpg" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5103675374154758978" /></a><br />(Imagem: Flávia Borba)<br />de Xavier Zarco, in "O guardador das águas"<br /><br />01<br /><br />Libertos<br />Os cavalos<br />Correm ao vento...<br />Admirada<br />Visualizo ambos!<br /><br /><br />02<br /><br />O vento passou ligeiro<br />pelos fios dos cabelos<br />me falou de liberdade<br />e se foi... deixando o cheiro.<br /><br /><br />03<br /><br />escrevo antes do cavalo em redor da casa<br />liberto o vento. Este é o meu ardente país<br />aproximo a flor do cais e do azul navio<br />escrevo ainda o cavalo do mar ao vento<br /><br /><br />04<br /><br />galopando sobre dedos enganados<br />projectam-se em horizontes interditos<br />enlouquecendo a palha da liberdade<br />dos sonhos pelos ventos mutilados<br /> <br />na noite, estranha ingenuidade<br />vão cavaleiros à rédea solta<br />aprender mentir a sua sombra<br />aniquilando o bafo do rebanho<br />em batalhas gélidas de maldade<br />à vileza de bons pretextos.<br /><br /><br />05<br /><br />… no limite da amargura,<br />na prepotência, no abuso,<br />débil reinado, pura loucura,<br />opressão que incomoda, perturba,<br />solto os cabelos ao vento, abro as portas que uso,<br />cavalgo palavras minhas, isolado, na imensa turba<br /><br />deambulo,<br />porque me encaminho<br />liberto de qualquer amarra<br />revigoro,<br />não anulo aquilo que se escreve, narra,<br />procuro<br />mote que não imploro,<br /><br />componho o que me apraz,<br />faço mais do que sou capaz,<br /><br />pensamento como cavalo irado,<br />desembestado,<br />vou mais além do que posso,<br />martirizo ondas do vento,<br />fustigado,<br />provoco sons cavos, profundos,<br />inundo meu entorno, giro à volta d´outros mundos,<br />invoco o Pai como nosso,<br /><br />calmo,<br />sossegado no meu retorno,<br />alivio penas, dores,<br />sensações, divinos sabores,<br />doce campina que atalho,<br />tarefa que me proponho,<br /><br />pertinente,<br />acicato mente de doidos, afasto garras, dentes,<br />cadeados e correntes,<br />quebro música mais funesta,<br />recolho martírios que vivo, trago o coração cativo<br />nesta liberdade que sinto,<br />neste vento que me liberta,<br />neste cavalgar que sonho<br />quando escrevo, quando componho!!!...<br /><br /><br />06<br /><br />Ah, as sombras destes tormentos<br />Dia após dia <br />cavalgando a loucura,<br />sem selas, esporas,<br />existir ou voar...<br />Cala-se-me a voz nesta surda tortura<br />Montadas de silêncio<br />no suor morno que me perdura...<br /><br /><br />07<br /><br />Olho grade da janela.<br />Contemplo mundo que passa.<br />Vejo cavalo sem sela<br />trotando à chuva que grassa.<br /><br />Quem está fora ali fica.<br />Aqui dentro, sai fumaça.<br />Chuva forte alambica.<br />O que mais dói é desgraça.<br /><br />Olhando assim pela grade,<br />não sou eu alma penada.<br />Prendi amor e saudade.<br />É cativa a madrugada.<br /><br />Pingo de chuva escorre.<br />Céu cabe dentro da mão.<br />Passarinho está de porre<br />por amor que não lhe dão.<br /><br />Olho tempo e vejo chuva.<br />Mundo está na prisão.<br />Talvez cela seja turva.<br />Não sei se cinza ou carvão.<br /><br />Chuva respinga do céu.<br />Do lado de cá, o chão.<br />No meu dedo, frio anel.<br />Ao meu lado, solidão.<br /><br /><br />08<br /><br />Alheei-me mas participo ter voltado<br />como os cavalos no vento, liberto!...<br /><br />09<br /><br />sem forma, o vento livre adere à minha pele,<br />como um vestido molhado.<br />cavalgamos o pensamento que realça<br />a substância, minha própria natureza<br /><br />liberta, solta no pasto<br /><br /><br />10<br /><br />há momentos. singram alheios<br />à raiz do pensamento. cavalgam <br />amuradas, deslizando e velozes, <br />como só o pensamento manso. <br />são o momento. aluvião deste oceano,<br />que importuna a reflexão do indizível,<br />no contraste do vento que solta a raiz<br />do cabelo impensável. pelo tempo <br />desnecessário e adiado<br /><br /><br /><br />11<br /><br />anônimos e discretos<br /><br />como personagens de um diário<br />íntimo numa qualquer passagem<br />romanesca despedem-se,<br />de um modo singular<br />[talvez de ver e sentir],<br />das circunstâncias do vento<br /><br />numa representação destemida<br />e inconformada, libertam-se.<br /><br /><br />12<br /><br />Libertos há pensamentos presos<br />presos há sentimentos livres<br />prisioneiros há corações alados<br />o catavento é escravo do vento<br />o vento é escravo livre<br />ainda vou montar em sua crina<br />para observar o mundo do outro lado<br />e quando de lá regressar<br />quero trazer preso nas rédeas<br />o sopro saindo da minha boca<br />quando então gritarei:<br />"Libertos, havia cavalos no vento<br />mas hoje minha voz liberta esse poema<br />que há séculos estava preso/cativo<br />nas entranhas da minha ignorância.<br /><br /><br />13<br /><br />Na vastidão o prado enorme <br />Colheita singular. odores <br />Sons e cores. o potro liberta <br />O vento cálido de narinas infladas.<br />Vibrante oferece-se ao templo <br />pelos quartos retesados <br />No resfolegar <br /><br />O prado e o animal nascem<br />Do mesmo sopro de vento<br /><br /><br />14<br /><br />são azuis os cavalos do vento<br />são ternos os cavalos do fogo<br /><br />e neste tempo que vivendo invento<br />cavalgo sereno as dunas do meu voo<br /><br /><br /><br /><br /><em>Colaborações:<br /><br />01 – Cármen Neves<br />02 – Denilson Neves<br />03 – José Gil<br />04 – Ísis<br />05 – Manuel Xarepe<br />06 – Carlos Luanda<br />07 – Maria José Limeira<br />08 – Francisco Coimbra<br />09 – Sónia Regina<br />10 – Lmc<br />11 – Sónia Regina<br />12 – JASilva<br />13 – Lmc<br />14 – Jorge Casimiro</em>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-67260927425127811312007-08-22T02:40:00.000-07:002008-12-10T19:10:25.356-08:00Circulo sem Circunferência em pérola<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiY2zZCypWwTWy_ztR8x1PqGWKo2Dfnm3XFyWlsJfrQoBub0pEp3t7kPMna7wr7PAGouL4MQXfmLYtOWwmorrl-I23CXFRamB2ZIUJKMEnjzFQSRsq8pQ7Rn1wp4p2eoRUNBN4WQewi3e4/s1600-h/Audrey_300.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEiY2zZCypWwTWy_ztR8x1PqGWKo2Dfnm3XFyWlsJfrQoBub0pEp3t7kPMna7wr7PAGouL4MQXfmLYtOWwmorrl-I23CXFRamB2ZIUJKMEnjzFQSRsq8pQ7Rn1wp4p2eoRUNBN4WQewi3e4/s320/Audrey_300.jpg" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5101458114468068146" /></a><br /><br />(Foto de Audrey Hepburn, autor desconhecido)<br /><br /><br />talvez a língua carnuda e lenta, carnuda e rápida<br /><br />em circulos sem circunfêrencias azuis na pérola<br /><br />talvez a mais pequena esfera na subtil tranquilidade total <br /><br />da minha língua, tento esfregar os olhos na água, fechar<br /><br />a esfera dos olhos mel negro , paisagem do mar no coração <br /><br />em silex cavalo e égua densos onde o fraco é forte e o forte <br /><br />paisagem e casas baixas e jardins , nos beijos construídos <br /><br />em cada segredo , em tuas faces de rosa, em teu cabelo de<br /><br />vento quero fluir a primavera em todo o meu corpo, levito<br /><br />como um pequeno castelo onde te espero na arrábida, feliz<br /><br />muito na flor da felicidade dos grandes dias, já nada é fumo<br /><br />virtual, tudo é lucidez ardente num pequeno escritório, os<br /><br />seios nas mãos e a procura da pérola , desejaria que o dia fosse<br /><br />tão longo como a vida na sua ordem triunfante, beijo-te no <br /><br />espumante, cavalgar e perceber tudo o que a ânsia alcança<br /><br />amo-te e perpassa o desejo, nos teus cintilantes contornos<br /><br />desejo-te na coluna tranquila e serei na nudez a alegria do lobo<br /><br />ó delicia do norte, quero o teu sul no meu sul aéreo fogo,loba<br /><br />bebo o teu néctar, faminta negrinha o sabor de uma fonte onde <br /><br />ainda não saciei a minha sede pura metáfora do secreto dedo, <br /><br />da mãointeira. Penso na pérola no circulo sem circunferência <br /><br />do cavalo o seu cilindro molhado aproxima o teu corpo nu levemente<br /><br />começa por modelar onde quero correr os campos no teu cavalo<br /><br />em cadência irregular, quero entrar profundamente suave<br /><br />até que o espumante te inunda, as unhas cereja se escrevem como<br /><br />um punho , a mão assenta nas nádegas no fulgor sentido<br /><br />no adágio das vinhas, o que ondula inquieta, vento do<br /><br />coração em pérola, a erva crescente os contornos infinitos<br /> <br /><br />José GilFilipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-87002806601130557832007-08-20T06:14:00.000-07:002008-12-10T19:10:25.540-08:00"A poesia não tem mais bondade que um abraço desconhecido"<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjNDJjYwwUhozNxvrlNL8eG7pnljKJJ0mBEovCTBEO-lETpjCAWtp2obX1HToQCsyIwiebnBgL_nqAZBD7yXFuSE-07Kk-DIwuLddvkChVrpuwY9wv1HPVHVENTyAcgmQZ2dJsNpqkmBJo/s1600-h/Abra%C3%A7o.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjNDJjYwwUhozNxvrlNL8eG7pnljKJJ0mBEovCTBEO-lETpjCAWtp2obX1HToQCsyIwiebnBgL_nqAZBD7yXFuSE-07Kk-DIwuLddvkChVrpuwY9wv1HPVHVENTyAcgmQZ2dJsNpqkmBJo/s320/Abra%C3%A7o.jpg" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5100772719292005154" /></a><br />de José Gil, in "Beleza"<br /><br /><br /><br />01<br /><br />Chamem-me fogo.<br />Mar infinito.<br />Sentir do peito em imensidão.<br />Ou dor<br />Miséria e sofrimento,<br />Lágrima em vela <br />desfeita pelo tormento<br />nos mares negros da solidão...<br />Chamem-me beleza ou indiferença,<br />Palavra de seda ou sonoridade oca.<br />ou apenas vazio pretensioso<br />num nada de palavras feito.<br />Tanto me faz o que pensem,<br />O que digam ou que trocem.<br />Ou que jamais eu seja som <br />a sair de outras bocas.<br />Sou apenas poema<br />uma intenção pequena<br />dum abraço deitado ao vento<br />sem desejos ou intentos<br />nem procura de outros peitos.<br /> <br /> <br />02<br /><br />Essa fantasia<br />de abraços anónimos,<br />mascara quase sempre,<br />uma militante hipocrisia<br /><br />por isso<br />quero<br /> a poesia<br />bem perto de mim.<br /> <br />03<br /><br />sim, meu amor,<br />perto<br />os versos pingam,<br />num borrão<br /><br />a ferida, o urro<br />que sangra a folha<br /><br />e a poesia lambe<br />[até que cicatrize]<br />dia após dia, noite<br />após noite.<br /> <br />04<br /><br />Quem és tu<br />que me abraça<br />sem me conhecer?<br />Não há na poesia<br />mais bondade<br />que no teu abraço.<br /> <br /> <br />05<br /><br />Há mais sinceridade<br />no abraço anônimo,<br />do burburinho da cidade<br />do que no beijo em curso<br />do velho amigo Urso.<br /> <br /> <br />06<br /><br />... pródigo convicto do abraço,<br />como escrevo, como faço,<br />estendo vontade para além de tudo,<br />com ele me confundo,<br />irmano meu corpo na mente que ascende, <br />na palavra que traço,<br />no poema que esculpo<br />na tecla onde bato,<br /><br />saído da Terra, ínfima semente,<br />planta que cresce, que abarca quem passa,<br />afago o mendigo<br />quando predigo,<br />esqueço a desgraça,<br />como destino d´amor que se converte<br />num gesto em que se aposta,<br />como se gosta,<br /><br />amigo desconhecido,<br />oferenda tão doce,<br />dádiva permanente, caminho,<br />bondade maior de todo o Universo,<br />num simples verso, <br />num gesto travesso,<br />piscar d´olhar cúmplice, imerso,<br />rosmaninho, incenso,<br /><br />olores que se espargem,<br />sem erros, sem margem,<br />sem fronteira<br />nem barreira<br />no cume da cordilheira mais alta<br />se aproxima quem se afasta, <br />se detesta, se mata,<br />crueldade inexistente<br />no âmago da gente,<br /><br />coração latente,<br />necessidade que se sente<br />num gesto emergente,<br />enlaço que faço,<br />quando dou, quando passo,<br />quando alinho palavras, <br />as arrumo, as empino,<br />as envio como destino!!!...<br /> <br />07<br /><br />Sete luas ainda povoam os sete <br />concomitantes abraços de ilusão<br /> <br />Serenos sempre serão os sete <br />instantes do reino dilúculo límpido<br />de sentido da luz e abnegação<br /> <br />A poesia mora no olhar os traços<br />entre beijos e abraços do dia<br />resta o espaço poalha a saltitar<br /> <br />Entre o sol e as luas o interregno <br />Lençóis esvoaçam no ar absorvendo <br />a melancolia das sete almas nossas <br />desconhecidas no sonho traçam o olhar<br /> <br /> <br />08<br /><br />discordando faço verso <br />num complexo abraço<br />desconhecendo o inverso<br />das horas nuas do laço...<br />veia de transcendência <br />sumo de transparência<br />é poesia a meu gosto<br />no suor do mês de Agosto.<br /> <br /> <br />09<br /><br />a mão abraça o rosto do sol<br />levanta os cabelos devagar<br />rede do enlaço, heras<br />entre os nossos corpos<br />de um lado e outro do oceano<br />bebo a areia ferida em sonho<br />enamorado de nervos livres<br />a pedra leve, que nos eleva<br />inundando as marcas vivas<br /> <br />é no sentimento e na dor<br />que o amor vale, cresce<br />dorme nas folhas da tua boca<br />lenta e ao fundo da terra<br /> <br /> <br />10<br /><br />(faz a canção como um rio,<br />faz o rio como uma canção) <br /> <br />um abraço desconhecido<br />pode sempre ser apenas um<br />meio de assaltar e roubar, <br /> <br />pode ser prazer apetecido,<br />num abraço deslumbrante<br />onde te falta o ar de tanto <br /> <br />inspirar fundo este mundo!!<br /> <br /> <br />11<br /><br />tudo espera bem na esquina do sol<br />como uma mancha de céu na cal<br />tudo espera o braço, o abraço<br />rente a carne viva das palavras<br /> <br />uma infância inteira a ler,<br />a mastigar na escrita um<br />bichinho de conta<br />e ter a bondade de amar<br />universal<br /><br /><br /><em>Índice de autores:<br /> <br />01 – Carlos Luanda<br />02 – Jamor <br />03 – Sónia Regina<br />04 – Denilson Neves<br />05 – Maria José Limeira<br />06 – Manuel Xarepe<br />07 – Luís Monteiro<br />08 – Ísis<br />09 – José Gil<br />10 – Francisco Coimbra<br />11 – José Gil</em>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com5tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-84538068904141565132007-08-20T02:20:00.000-07:002008-12-10T19:10:25.684-08:00Maria*<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi9oYOxFRyVuJRgYxuGrWeoM4rSN2ZXyScpaWGjXelLx1TrgmSSA4653gzlabf61FB5E6M8vQ-YyXkVK8J2cQpJ9S6OkwWZDteC9-bJQXQZko-Z2zU3Dyr7O32Ba5-RbqVVgUACLfUaBec/s1600-h/menina..dia%252010..melhor"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEi9oYOxFRyVuJRgYxuGrWeoM4rSN2ZXyScpaWGjXelLx1TrgmSSA4653gzlabf61FB5E6M8vQ-YyXkVK8J2cQpJ9S6OkwWZDteC9-bJQXQZko-Z2zU3Dyr7O32Ba5-RbqVVgUACLfUaBec/s320/menina..dia%252010..melhor" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5100714080103512850" /></a><br /><div align="justify"><br />(Foto: autor desconhecido)<br /><br />de Sónia Regina</div><div align="justify"> </div><div align="justify"> </div><div align="justify"><br /><br />Livre de buscares significações e razões para tudo, acordas e, quando o fazes, despertas completamente. Tampouco te aventuras pelo passado: a importância está no que és agora. Interessante talvez venhas a achar, um dia, a brincadeira do passado e do futuro e, quando já não for uma brincadeira - por tão sérios serem seus efeitos - recorrerás à memória para traçares teu presente. Que este, insistente, possa falar e dele seja, o teu futuro, uma decorrência temporal.<br />A leitura ou a escrita não são suficientes por si só, há mais. Não paga contigo mesma o tributo à vida: há que ter algum, mas podes escolhê-lo. Embora a vida não seja um passeio, é uma deliciosa ventura – e aventura. Reflexões fazem parte e as discussões solitárias que terás contigo mesma te ajudarão a forjar um estilo próprio: elo que te garantirá poderes nadar no mar em que tantos se debatem.<br />Isto é uma imagem, mas não deixe que elas te dirijam, tampouco as palavras. Usa-as tu, na tua jornada, e escolhe o teu caminho. Muda-o quando achares por bem ou te aprouver, mas busca dar conta das movimentações necessárias, o amor presente.<br />O amor é um estranho fogo, por causa dele nos movemos: é o sentido da vida. A direção, damos nós.<br />Chegarás a lugares. Alguns difíceis de alcançar, talvez por isso mais saborosos. O desafio é inerente ao humano, as conquistas nos dão o valor das coisas. O sonho é fundamental, desde que construas os alicerces para realizá-los, senão poderás ficar um tempo demasiado à beira de alguma estrada ou, talvez, te debatendo naquele mar...<br />As artes são boas companheiras, a serenidade e a paz são sábias. As paixões, embora efêmeras, são necessárias. Nada se faz bem feito sem um interesse que nos tangencie o coração. "Esse interesse, chamamo-lo paixão quando, recalcando todos os outros interesses ou alvos, a individualidade por inteiro projeta-se sobre um objetivo com todas as fibras interiores de seu querer e concentra nesse alvo todas as suas forças e todas as suas necessidades. Nesse sentido, podemos dizer que nada de grande se realizou no mundo sem paixão." Assim dizia Hegel - um filósofo que será sempre importante - no livro "A razão na história".<br />O coração fala e diz coisas importantes, a serem levadas em consideração – não é só um músculo, ou morada da alma. Ouve-o, mas protege-o: ele é um eterno bebê – não como tu, que crescerá - sempre disposto a pular no colo de quem o toca. Às vezes se desaponta (o que se reflete em nós, sua habitação): nem sempre há um colo disponível atrás de um toque. Deixa-te tocar, não te defendas, mas cuida-te.<br />A natureza, ainda que estejas na cidade, não a dispenses. Há dias calmos e quentes, mesmo em junho. O céu é mais azul nessa época e olhar a lua à noite não te esfriará, poderás dormir com o calor que amealhares para ti durante o dia.<br />Os grilos sempre cantam lá fora, em noites no campo, muito mais estreladas. Ouvi-los e vê-las é magnífico e podes agradecer aos teus pais estares ali. Nada relacionado com o fato deles serem participantes da tua existência... E tudo, também.<br />Se não ouvires as cigarras, é porque só voltam para anunciar o verão. Mas existem, mesmo que não saibas onde estão. Há incongruências que basta reconhecer e há coisas que existem,<br />independente de creres. Contudo, atenta à filosofia e à metafísica, para não te enredares nelas.<br />As coisas que virão a te agradar estarão sempre presentes, fazendo parte de um espaço ao qual irás quando quiseres, sendo esses vôos objeto de teus desejos.<br />O estar referida ao tempo presente te engrandecerá. Tudo flui mais naturalmente e não pré-ocupares a mente te libertará.<br />Não coloques peso a mais do que já tiverem as tarefas a que te propuseres. Só assim – penso eu - sentirás o prazer de vivê-las. Não cries problemas das situações difíceis. Obstáculos são para serem ultrapassados ou contornados e problemas... Bem, uma vez criados têm que ser resolvidos. A matemática te demonstrará isso com números, mas vale a analogia.<br />Tudo faz parte, não deixa de exprimir-te. Atenta às tuas impressões, expressa-te.<br />O tempo é relativo e um instante será, ou não, breve. Sua duração depende da vida de cada momento. Olhar para as folhas em uma manhã de sol é tão bom, que o bonito simplesmente apreciado pode ser um instante infinito.<br /><br />Um beijo carinhoso<br />da Sonia</div><br /><br />* Tema do Mês: "Bebê, o infinito em ti se encerra"Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-1583182982713720192007-08-20T02:10:00.001-07:002008-12-10T19:10:25.827-08:00Amor-perfeito<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg6yBDigVvXQxXrgvBKlSHs9fBG8PiwP9uhhT_owh2ZNMcFwpJRP7H768WnNvaajS2H2AN0rH7VNGizLtYHQ7mXQZ3uAUwpPpbr9UzBNt3Nvvd5DhPbO-N8XPBCJ7StHd1SBHfEBKDoeVw/s1600-h/amorperfeito.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5100707697782110978" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEg6yBDigVvXQxXrgvBKlSHs9fBG8PiwP9uhhT_owh2ZNMcFwpJRP7H768WnNvaajS2H2AN0rH7VNGizLtYHQ7mXQZ3uAUwpPpbr9UzBNt3Nvvd5DhPbO-N8XPBCJ7StHd1SBHfEBKDoeVw/s320/amorperfeito.jpg" border="0" /></a><br /><div></div>(Foto: autor desconhecido)<br /><div></div><br /><div></div><br /><div>se em cada palavra de amor<br />florisse uma flor<br />em minha boca<br />eu te oferecia um ramo de acácias<br /><br />seriam amarelas<br />especulando o sol de todos os dias<br /><br />se em cada palavra de amor<br />eu te tomasse o mel dos lábios<br />e te estendesse<br />na suavidade do meu colo<br /><br />seria doce cada memória<br />aspirando o enlevo dos beijos<br /><br /><br />se em cada palavra de amor<br />eu unisse ecos dos nossos sussurros<br />os espalharia ao vento<br />sedentos por unirem o mundo<br /><br />teria criado a perfeição</div><br /><div></div><br /><div>Vera Carvalho</div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-65917554726703547302007-08-14T02:16:00.000-07:002008-12-10T19:10:25.918-08:00In Nomine<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjGq341cFm-sX-qXorTB8WGKxGHxCyCvBUGbGVL4B-uaVKvIAyJfZGYCwiN9VMYNiLKG9jeDMr22H0itlMKKhJDTBnxzMnpvgOe49xwXua1zwluXQ4pufzfx8IPwCyTcE7KMrD6akVJUbU/s1600-h/concha.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5098486332463976226" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEjGq341cFm-sX-qXorTB8WGKxGHxCyCvBUGbGVL4B-uaVKvIAyJfZGYCwiN9VMYNiLKG9jeDMr22H0itlMKKhJDTBnxzMnpvgOe49xwXua1zwluXQ4pufzfx8IPwCyTcE7KMrD6akVJUbU/s320/concha.jpg" border="0" /></a><br />(Foto: autor desconhecido)<br /><div align="justify"> </div><div align="justify">9.<br /></div><br /><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify">dizem: as perseguições foram há muito tempo, quando ainda havia</div><div align="justify">paredes dentro da casa e as relíquias dos mártires era inatingíveis,</div><div align="justify">como um signo de amor que ainda não revelasse a sus face oculta</div><div align="justify"></div><br /><div align="justify"><br />e são tantas,</div><div align="justify">tantas que as lágrimas apenas derramam o que resta do meu sangue, e</div><div align="justify">pareço quieto. e pareço firme quando sei que a chama me fará explodir</div><div align="justify">e que o meu corpo já não é a alma toda</div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">dizem: é assim a cristandade. a alma não transporta o corpo nem<br />o resume. é uma entidade separada. de fora, o coração, o olho</div><div align="justify">esquerdo e o olho direito. a lágrima. a língua que inventa canções</div><div align="justify">quando o sangue vibra na chama</div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">não, não é o corpo todo. o corpo não renuncia ao amor nem à dádiva<br />ser tudo perfeito, como se eu fosse uma concha que vivesse mil anos e</div><div align="justify">fosse apenas isso. um lento entrar e sair, assumindo a morte e uma</div><div align="justify">gratidão sem limites. saberia que dormiria a seguir e que atravessava</div><div align="justify">um oceano infindo, num mar que não é meu, mas que pertence a todos os</div><div align="justify">homens.</div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify">Jorge Vicente</div><br /><div align="justify"></div><br /><div align="justify"></div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com0tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-25423791256268703942007-08-14T01:09:00.000-07:002007-08-14T01:18:35.223-07:00Entrevista a Mónica Correia*<div align="justify">por Vera Carvalho e Carlos Luanda<br /><br /></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"><strong>1. Mónica Correia, sabemos que a tua escrita literária se iniciou na adolescência. Existiu alguma influência marcante que te levou para a poesia?<br /></strong><br />Mónica Correia - Desde criança que gosto de ler, li livros infantis e quando comecei a entrar na adolescência li as aventuras típicas da idade como os Cinco, os livros sobre droga: Christian F, Viagem ao Mundo da Droga e ainda baseados em histórias verdadeiras como Papillon de Henri Charriére. Quando entrei na minha adolescência hormonal devia ter mais ou menos 15 anos (é que eu era atleta de competição e isso atrasa o desenvolvimento) sentia-me a mulher mais incompreendida e infeliz do mundo…até encontrar um livro de poesia de Florbela Espanca na Biblioteca Municipal de V.N. Gaia e descobrir que havia mais mulheres que pensavam e sentiam como eu. Aí começou esta descoberta que é das únicas coisas a que me mantenho fiel: a poesia.</div><div align="justify"></div><div align="justify"><strong>2. Como Mulher, como difícil arte de o ser hoje em dia, como consegues conciliar os papéis de esposa, mãe, dona de casa, profissional e poeta?<br /></strong><br />Mónica Correia - Nada na vida é fácil e há sempre alguma coisa que vai ficando para trás…<br />Um dia, algures na minha adolescência, confrontei a minha mãe com um elogio que um professor lhe tinha feito a respeito da minha escrita ao que ela me respondeu que seria bem melhor que eu aprendesse a limpar o pó! Mas definitivamente limpar o pó não "faz o meu género"! Por isso, sempre que posso é o papel de dona de casa que vai ficando em espera. Quanto ao resto faço os possíveis para os desempenhar da melhor forma mas só perguntando aos intervenientes em questão é que poderemos confirmar!<br /><br /><br /><strong>3. Mergulhando nas tuas palavras:<br /><br />" Cânticos de silêncio que grito nas pautas de vida,Acordes sem acordo e desconcertante hipoteca de som.Escrevo a letra imaginária que cai dos olhosE se transforma em arlequim da poesia singular.Sem as cores que reflectem o cristal do teu olharSem o brilho perfeito reflectido da pele de vidro.Canto a voz que se agarra aos meus dedos mutáveisE deixo cair palavras na página finita de dias. "<br /><br />Qual o sentido da tua mensagem poética? Pretendes expressar os teus sentimentos pelas palavras?<br /></strong><br />Mónica Correia - As histórias contam-se nas palavras do corpo e no corpo das palavras.<br />É um misto de emoções com necessidade de criar.<br /><br /><br /><strong>4. Citando Maria Teresa Horta "Não há nada que a nossa voz não abra", Mónica que portas abririas ao futuro da humanidade?<br /><br /></strong>Mónica Correia - Da tolerância e respeito à diferença. Todos nós vemos o mundo de forma diferente e presunçosamente achamos sempre que a nossa forma é a mais correcta. Devíamos ser mais tolerantes e respeitar a visão dos outros.<br /><br /><br /><strong>5. Mónica Correia. Concordas com a afirmação de que toda a poesia é feminina ou pensas que o fenómeno poético está ligado a um universo de género indefinido?<br /><br /></strong>Mónica Correia - A poesia é como os anjos: não tem sexo, no entanto pode ser muito sexual e assim sendo está indiscutivelmente associada aos homens. Não, não são os homens com falo de que falo, mas sim a humanidade! È uma forma de criação pintada de palavras.<br /><br /><strong>6. Vejo em ti um espírito inconformado e lutador. Certamente autocrítico também. Como analisas a tua própria poesia?<br /></strong><br />Mónica Correia - Como pequenos retratos que tiro na realidade suspensa com a cor da fantasia. Quando vou ao baú sinto os poemas velhos e sem força, mas guardo-os novamente, fazem parte da caminhada. Continuo a tentar escalar a montanha mas muitas vezes sento-me cansada e espero que o céu se pinte de outra cor para voltar a escrever.<br /><br /><strong>7. Achas que um poema é apenas uma semente ou lês a articulação das palavras como quem segue com o olhar os ramos duma árvore?<br /></strong><br />Mónica Correia - Todas as palavras são articulações: "a insustentável leveza do ser" é constituída pelas ramificações dos ossos nos poemas do corpo. Deito-me nos desvios dos ramos e colho a poesia, às vezes verde, às vezes madura, mas sempre com sabor a paixão.<br /><br /><br /><strong>8. Quando dizes, e cito-te:..."E cruzo as mãos de orações na absolvição do existir", pensas que a poesia é antes de mais uma atitude de libertação e purificação interior, assim como a tentativa de expiar algo indizível, ou pelo contrário um eterno franquear de fronteiras?<br /></strong><br />Mónica Correia - A poesia como qualquer tipo de escrita é um acto de libertação, mas esta libertação tanto pode ser uma punição como uma satisfação. Gritar nas palavras tanto pode ser uma gargalhada estridente como um som de dor. A emoção está lá a enfeitar as mensagens que dissecamos e consumimos como pão e água ou como o pecado da gula!<br /><br /><strong>9. Acreditas que um dia a Humanidade encontrará verdadeiramente a Palavra?</strong><br /><br />Mónica Correia - Não acredito que se encontre a palavra universal… em cada país há um dicionário e há palavras que nem têm tradução de umas línguas para as outras, como a nossa saudade. Por isso e pelos valores diferentes que existem nas várias linguagens acho que nunca chegaremos a um consenso de Humanidade.<br /><br /><br /><strong>10. Se pudesses ser tu a descobrir a Palavra o que farias com ela?<br /></strong><br />Mónica Correia - Acho que se tentasse ir em cruzada para a espalhar pelo mundo, morria na fogueira ou era apedrejada por aqueles que me vissem como a bruxa da palavra do pecado. Nunca estamos preparados para perceber e aceitar o que não está ao alcance dos nossos olhos…</div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"></div><div align="justify"><br /><br /><br />* Mónica Susana de Oliveira Correia nasceu a 14 de Abril de 1972 em Vila Nova de Gaia. Foi ginasta de competição durante 12 anos e frequentou a Escola Superior de Jornalismo no Porto, tendo enveredado para a área de Gestão e Marketing.<br />A sua escrita iniciou-se aos 17 anos, quando as suas emoções eram maiores que o seu corpo e tinham de se extravasar de alguma forma. Criou o blog "omeuumbigo" <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://perigososcontactos.blogspot.com/" target="_blank">http://perigososcontactos.blogspot.com/</a>, onde publica as suas poesias e para além de fazer parte da nossa lista participa na Lista Escritas de José Félix.<br />Em Dezembro de 2006 lançou o Livro Corpos Sem Som .<br />Em Março de 2007 participou na Antologia de Escritas N. 4 e em Junho na Antologia Poética Amante das Leituras. </div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com2tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-44649646998228241642007-07-31T06:13:00.000-07:002007-07-31T06:17:49.563-07:00Todo o acto de escrever / É uma experimentação.de Luís Monteiro da Cunha<br /><br />01<br /><br />Se o ato de escrever <br />É uma experimentação<br />Escrevo <br />Saudades, Luís Monteiro da Cunha<br />Porque os amigos<br />Moram em meu coração.<br /><br /><br />02<br /><br />As palavras adormeceram em mim<br />serena é sua respiração<br />em seu sono profundo<br />Olho a quietude do rio sob<br />a canícula dormente do estio<br />e um filme verde de incêndio e dor <br />no outro lado do mundo<br />impede o meu regresso ao poema<br />Fica-me este labor de consoantes e vogais<br />uma arquitectura de fonemas <br />nascida da experimentação mais<br />um exercício de raiva<br />antiquíssimo método de chorar no silêncio.<br /><br />03<br /><br />Não quero me exibir em dialética,<br />Tampouco me entregar à fantasia,<br />Mas... Será o poema cria poética,<br />Ou num mundo de rimas preexistia?<br /><br />Será o poeta um mero montador,<br />Lírico pescador da poesia<br />Particionada pelo Criador<br />Na chama inspiradora que irradia?<br /><br />Se assim for - Que metáfora mais bela!<br />O poeta é um catador de versos,<br />Que encaixa em rimas na estrofe certa.<br /><br />Mas para ser poeta, não esqueça:<br />Não basta garimpar nestes recessos;<br />Há que saber montar quebra-cabeça.<br /><br /><br />04<br /><br />no espaço aberto da imaginação<br />existe uma nascente profunda<br />escrita no rio do pensamento<br />que transborda ao coração <br /> <br />células impossíveis de conter<br />igual sede que temos de beber<br />o amor de cada palavra criada<br />escorrendo entre dedos<br />horizontes de afagos.<br /> <br />interdição às sensações<br />emoções realidades e sonhos?<br />Não.!<br /><br /><br />05<br /><br />espere<br />experimente<br />exprima-se<br />especule<br />exibindo<br />espiritual<br />espectáculo<br />exuberante<br />esperando<br />extasiar-se<br /><br /><br />06<br /><br />Não desisto de ti<br />Que és nome silencioso<br />Que madruga e veste <br />As minhas mãos.<br /><br />Algo mais intenso e perturbador<br />Mergulham sorrisos a alma só<br />Impulso corre as veias solidárias<br />Este auge do ser implacável<br />Compra-me o espírito sem dó.<br /><br />Os olhos observam a paisagem <br />Despidas as mãos, sem palavras,<br />Vivo desse impacto<br />Sem sonhos refugiam-se as estradas.<br /><br />Não desisto de ti<br />Sem ser nada ou ninguém<br />Construí um rio de palavras<br />Para adormecer nas mãos de alguém.<br /><br />Impulsionas-me, sugestionas-me,<br />Questionam-me as frases devaneias<br />Que são o meu fôlego silenciado<br />Desejo de aventura, enamorado.<br /><br />Criei-me e dei-me ao teu esplendor<br />Mais altivo que o dos anjos,<br />Senti-me uma criança a acordar<br />Braços abertos abraçam o mar.<br /><br />Não desisto de ti<br />Que és nome silencioso<br />Que madruga e veste <br />As minhas mãos.<br /><br />Chamem-me poeta...<br /><br />Chamem-me o que quiserem...<br /><br />Sem ti, eu sofria...<br />Sem ti padecia...<br /><br />Morria?...<br /><br /><br />07<br /><br />Levou-me para um quarto de hotel barato<br />Fechou a porta da minha timidez e abriu a da nudez<br />com a mão, com a boca com o que eu escrevia.<br />Havia uma janela virada para o corpo donde o calor saía<br />para uma parede branca nos olhos, iluminando-os<br />que pagou a conta do quarto, a comida dos filhos, a virgindade <br />mas os vagidos de prazer do acto no quarto de papel oferecia a quem os lia.<br /><br /><br />08<br /><br />experimentar<br />o acto de escrever<br />exprime a experiência<br />humanamente + profunda<br />adição múltipla<br />de todas as operações<br />o acto da escrita revela-se<br />plenamente X sem conta<br />tudo aqui conta<br />se cada verso vive<br />a mais completa luta<br />para chegar à revelação<br /><br /><br /><br />09<br /><br />... o acto de escrever, em si,<br />é comunicação, entendimento<br />entre seres que julgam,<br />introvertem, partilham,<br />comungam<br />dessa habilidade com um fim,<br />experimentando, como diversão,<br />enovelando termos novos, confusos,<br />busca incessante duma definição,<br />clarão mais pertinente,<br />rasgo raro, luminoso,<br />estrépito<br />som de vulto, fragoroso, <br />novel forma de manifestação,<br /><br />descoberta que se tem, temporária sensação,<br />sinais trabalhados na proveta do pensamento,<br />conversão em traços, espaços, vírgulas e pontos,<br />imagens vividas em profusão,<br />acontecimentos que nos entram pelas janelas que temos, <br />olhos abertos em permanência,<br />aglutinação depois da afluência,<br />esmagamento em almofariz<br />do que se vê, do que se ouve, do que se diz,<br /><br />fértil imaginação,<br />sem fabricação extemporânea,<br />casuística, oportuna, <br />descrição que aflui, nos esmaga porque rói, <br />se traz guardada, funda,<br />algo estranha, profunda<br />necessidade que chaga, fere,<br />amolga, dói,<br />incomodidade permanente,<br />que se transforma, num repente,<br />dádiva de tanta gente, <br /><br />aventura que se vai contando<br />na escrita que se alinha,<br />nos sinais com que se traça<br />tudo aquilo que passa,<br />experimentando,<br />num acto que se torna hábito,<br />grafismo que se torna escrita,<br />imitando, sentindo <br />manifestação invicta<br />estando sentados, fugindo,<br /><br />quem cria, depois de criado,<br />evolução que nos foi dada,<br />por quem desdenha,<br />não sendo amado,<br />mortal perdido nas trevas<br />numa busca insana, frutuosa, <br />sorte incerta, desditosa,<br />contributo inestimável,<br />no campo de tantas artes,<br />recantos humildes, tantas partes,<br /><br />na ponta dum pincel,<br />nas linhas de qualquer papel,<br />no bico aguçado dum cinzel,<br />na carne que se transforma <br />em alimento, como norma,<br />no vegetal que se multiplica,<br />na ave que se mata, come,<br />no peixe que se escama, se deglute,<br />se ingere,<br />nas vestes que nos arroupam,<br />nos enganos que nos propomos,<br />fazendo aquilo que somos, <br /><br />nos mortos que se não poupam,<br />nas guerras ferozes, bárbaras,<br />guerras com arte, matanças,<br />quantas novelas, mudanças,<br />acumulações, simples aparas,<br />existências que deixam marcas,<br />riscos, arabescos<br />diferentes, escurecidos, frescos,<br />graciosos, ridentes, cinzentos,<br />passagens, pegadas... momentos,<br /><br />acto, como experimentação,<br />alocução inebriante,<br />incitamento de quem lê,<br />escritos mais pensados, escusos, <br />não poéticos,<br />disfarçados pelo mal que encerram,<br />hipotéticos,<br />quando gritam, quando berram,<br />provocando agitação,<br /><br />confrontos medonhos, perversão,<br />enganos na multidão,<br />não são do coração,<br />espécie de maldição <br />adulterando o que há de belo<br />gerando ódios, confusão,<br />antípodas de qualquer anelo!!!...<br /><br /><br />10<br /><br />Escrevo p'ra não perder o traquejo<br />p'ra não deixar acumular esta maldita<br />ansiedade que tenta me domar<br /> <br />Brinco com as palavras<br />quando desconcertantes imagens<br />invadem o pensamento <br /> <br />Se ponteio ou pontuo<br />nenhuma diferença fará<br />quero apenas garatujar.<br /><br /><br />11<br /><br />numa tentativa de contornar as palavras da voz<br />escurece-me a tinta <br />que goteja da pena<br />é negra<br />oculta-me o entendimento<br /><br />castigo a minha ambição<br />aprimoro o traço<br />ardo de ânsia <br />mas a gota continua a pingar e<br />é negra<br /><br />derrubo-me infrene sobre o papel <br />e esmago as palavras <br />sou ruína sem entender<br />o que queria<br />ter dito<br /><br /><br />12<br /><br />Correm leves as letras breves<br />sem cuidar do meu intento<br />Uma daqui,<br />outra do vento.<br />Outra do sangue que nas veias ferve.<br />Não sabem mais que estar caladas<br />Quietas, firmes,<br />Arrumadas,<br />Em mortalhas de silêncio.<br />Sabem de si só o momento<br />criado na ponta do querer.<br />Um acto-vontade congelado.<br />Eternamente condensado<br />que embora lido, ressuscitado<br />é o somente o instante pensado<br />Distante e criado ao escrever<br /><br /><br />13<br /><br />que corram céleres, as letras<br />palavras, sílabas encarnadas<br />não pensadas, escritas<br /><br />doídas ou alegres, se ditas<br />no frio ou no quente <br />[fora da mente]<br />ainda que ensaiada,<br />a vida<br /><br /><br />14<br /><br />Foge-me o sossego<br />quando, às vezes, vejo<br />palavras à esmo<br />contando segredos<br /><br />É que sou arremedo<br />de tudo que escrevo<br />não conto segredo<br />mas sempre me vejo<br /><br /><br />15<br /><br />Lusitana palavra<br />Une amor, amizade<br />Imagem trabalhada.<br />Zelo, dedicação.<br /> <br />Carimbo cunho<br />Únicamente mão<br />Não deixa o desânimo<br />Habitar o coração...<br />Amante da palavra!!!<br /><br /><br /><em>Autores:<br /><br />01 – Carmen Neves <br />02 – Bernardete Costa<br />03 – Denilson Neves<br />04 – Ísis<br />05 – Francisco Coimbra<br />06 – Paulo Themudo<br />07 – Ana Maria Costa<br />08 – Francisco Coimbra<br />09 – Manuel Xarepe<br />10 – Andrea Motta<br />11 – Vera Carvalho<br />12 – Carlos Luanda<br />13 – Sónia Regina<br />14 – Denilson Neves<br />15 – Ísis</em><br /><br /><br /><strong>Amigos, espero que vos agrade esta versão final<br />do desafio semanal. <br />Obviamente, esta semana não comento o teor do poema.<br />Delego-vos essa tarefa.<br /><br />Obrigado a todos.<br /><br />Luís Monteiro da Cunha </strong>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com27tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-35926205588573577772007-07-20T02:14:00.000-07:002008-12-10T19:10:26.255-08:00Fogo Cruzado,<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgXn5Nkqym8TBqX6jgbbGFPF8qsjbpOCbHysJ0eQBf3ZAqLk2MbfPsPPfJ7-PrU-sX9E0wG6360xNKA2AqyyaSDzSO94ErHA-3bRs7H0K83vlqv2VIIg_n9z3QceKJUmawpXo1OQEBoc3k/s1600-h/Av%C3%B3+e+neto.jpg"><img style="display:block; margin:0px auto 10px; text-align:center;cursor:pointer; cursor:hand;" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEgXn5Nkqym8TBqX6jgbbGFPF8qsjbpOCbHysJ0eQBf3ZAqLk2MbfPsPPfJ7-PrU-sX9E0wG6360xNKA2AqyyaSDzSO94ErHA-3bRs7H0K83vlqv2VIIg_n9z3QceKJUmawpXo1OQEBoc3k/s320/Av%C3%B3+e+neto.jpg" border="0" alt=""id="BLOGGER_PHOTO_ID_5089210011748164002" /></a><br /><br />(Foto: Autor desconhecido)<br /><br />de Maria João Oliveira<br /><br /><div align="justify">A bambolear-se nuns setenta anos bem abastecidos de rugas e de sol, limpa a boca com as costas da mão e anuncia:</div><div align="justify">- Olha, vou-te bater, ouviste?! Vou-te bater! Anda cá! Olha, a avó vai peneirar! Canta comigo: "peneira...peneirinha... peneira... peneirinha..."</div><div align="justify">- Não quero!</div><div align="justify">- E melão, queres?</div><div align="justify">A criança, que já não vai em cantigas, salta como uma mola e estende a mão para uma talhada de melão,fresca como a brisa que brinca nos seus cabelos.</div><div align="justify">- Porco, já tens o melão cheio de areia! - grita, com as mãos cravadas nas ancas e a cabeça bem erguida,estratégia militar a que recorre, para melhor disciplinar a sua criança. Esta riposta aos guinchos, porque afinal ela "tem querer" e é preciso muita paciência para aturar os adultos.</div><div align="justify">- Eu berro, berro, farto-me de berrar, mas não consigo fazer nada dele! - desabafa a avó, despenteada e vermelha como um tomate, sem reparar na beleza das ondas e no papagaio de papel que saúda o mar, com as cores do arco-íris.</div><div align="justify">É certo que este papagaio nunca se constipa nem diz o nosso nome, mas também é belo nas mãos da criança que o olha, embevecida.</div><div align="justify">- Esta manhã, "alevantei-me" e já ele estava: " ó mãe, ó mãe, quero fazer chichi! Não há quem sossegue com este miúdo!</div><div align="justify">- Tu berras com ele e, logo a seguir, beijas o puto. </div><div align="justify">Em que é que ficamos, afinal? - questiona o filho mais velho, com ares de quem já deu uns mergulhos nos mares da psicologia infantil.</div><div align="justify">- Põe a boina na cabeça, estropício! - berra a avó.</div><div align="justify">- Olha o balão, olha o balão, não o rebentes! - grita a mãe</div><div align="justify">- Vai buscar a bola, pá! - ordena o primo.</div><div align="justify">Com as pernas ainda trôpegas, a criança abraça uma bola do tamanho do mundo.</div><div align="justify">- Upa, filho! Não podes com a bola? - pergunta a mãe,tentando dar uma ajuda.</div><div align="justify">- Se cais com a cara no chão cheia de creme, ficas lindo, ficas! - avisa a avó.</div><div align="justify">- Vamos à bica, Flávio? - convida o pai.</div><div align="justify">- Estás a fazer uma análise do lirismo migratório? -brinca o Carlos Oliveira, meu marido.</div><div align="justify">- Gosto de escrever, junto do mar, como sabes, mas jánão tenho papel...</div><div align="justify">- Isso não tem importância, porque tu até és capaz de escrever numa folha de alface...</div><div align="justify">Neste momento, chega o almejado silêncio. A família tinha ido à bica.</div><div align="justify">Vinte minutos depois...</div><div align="justify">- Dá a mão ao primo, Flávio! - ordena a avó.</div><div align="justify">- Eh, caramba! Manda a bola cá p´ra fora! - desafia o primo - caraças, a bola foge! Corre atrás dela!</div><div align="justify">Dá-lhe um pontapé, anda! Chuta prá qui!</div><div align="justify">O Flávio enche os pulmões de ar e dá um pontapé eusebiano na bola grande.</div><div align="justify">- Boa, pá! É assim mesmo! Ainda hás-de ser um craque nisto! Ter futuro, pá!... Um Figo!</div><div align="justify">O Flávio solta uma gargalhada que me refresca por dentro.</div><div align="justify">- Agora vais fazer ó-ó, ouviste? - ameaça a avó, naquele momento. Lá se vai a alegria do jogo, a alegria de abraçar a bola multicor, a alegria de transportar as sandálias no carrinho de plástico...</div><div align="justify">Fechar os olhos a este areal reluzente e a estas ondas provocantes, é um pecado que brada aos céus. Por isso, as gargalhadas do Flávio depressa se transformam no berreiro infernal que estou a ouvir.</div><div align="justify">- Bolachinha americana, pró menino e prá menina! Tenham calma! Não chamem todos ao mesmo tempo! Quem não tiver dinheiro, não se preocupe, não há problema. Não come e pronto!Cumprimentos lá em casa! - exclama o "homem das bolachas", baixo e gordo, sorriso aberto e pele bem tisnada pelo sol.</div><div align="justify">- Só cá faltava este! - resmunga a avó do Flávio.</div><div align="justify">- Eu quero bolachinhas daquelas - implora a criança com grossas lágrimas nuns olhos verdes de fazer inveja ao nascer do sol.</div><div align="justify">- Vais mas é "dromir" e pronto! - grita a avó, mais uma vez - olha, dou-te um "chocolá", se tu "dromires"a sesta.</div><div align="justify">- Eu não quero dormir! Não quero! - berra o Flávio,dando um pontapé furibundo na caneca de chá da avó. Na verdade, os adultos, por vezes, são uns desmancha-prazeres e uma criança nem sempre consegue ter paciência para os aturar. Saint-Exupéry teve razão, ao dizer que " as pessoas grandes (...) não conseguem compreender nada sozinhas, e é cansativo,para as crianças, estar a toda a hora a explicar".</div><div align="justify"> </div><div align="justify"> </div><div align="justify"><strong><em><br /><br />Análise Literária, por Maria João Limeira</em></strong></div><div align="justify"><strong><em></em></strong> </div><div align="justify"><em>Este texto "Fogo cruzado", de Maria João Oliveira, tem tudo para ser Literatura (e das boas!): ritmo, movimento, dramaticidade, palco, platéia, na arte que às vezes é circo, em outras, ópera, na maioria dos casos, novela das oito, numa hora, patético e noutras,ternura...É uma Prosa boa que enfoca os conflitos de gerações,uma de terceira idade, outra de tenra infância.A autora combina bem os estereótipos na construção da história, misturando amor e lágrimas, arrancando da platéia ora risos e, em outras vezes, indignação. Mas tudo na maior alegria! E mais: ela mesma, Maria João Oliveira, é também personagem. É um texto criativo, onde o processo pedagógico se realiza às avessas, como no livro de Saint-Exupéry, no qual se inspira.Um ótimo texto!</em></div><div align="justify"> </div><div align="justify"> </div><div align="justify"> </div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com1tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-7507987301559655702007-07-17T01:35:00.000-07:002008-12-10T19:10:27.193-08:00"Sei de pedra como sei de deus por isso, tropeço.",<a href="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhBuG8v7HmdD0n0zcMDvUK3S6OlRDtEE013J-cYuI5Gwikj4GLXHW1QzsoxITHKbMfx1Nl6IeOcjUMakBuZsUUc_enAtoehIkFios-zVXzof5m1fvXFg3R1sEb-8xaaLO3wi6lP4TowybA/s1600-h/Pedras.jpg"><img id="BLOGGER_PHOTO_ID_5088084721726677394" style="DISPLAY: block; MARGIN: 0px auto 10px; CURSOR: hand; TEXT-ALIGN: center" alt="" src="https://blogger.googleusercontent.com/img/b/R29vZ2xl/AVvXsEhBuG8v7HmdD0n0zcMDvUK3S6OlRDtEE013J-cYuI5Gwikj4GLXHW1QzsoxITHKbMfx1Nl6IeOcjUMakBuZsUUc_enAtoehIkFios-zVXzof5m1fvXFg3R1sEb-8xaaLO3wi6lP4TowybA/s320/Pedras.jpg" border="0" /></a> ( Foto: Autor desconhecido)<br /><div></div><br /><div>de Iara Maria<br /><br />01<br /><br />Nem sempre se vê a pedra<br />invisível<br />seu toque maltrata magoa<br />se soubesse de seu lugar<br />saberia também desse deus<br />invisível<br />mata se apregoa!<br /><br />02<br /><br />o pó de ar na folha da pedra<br />a mesa oval, a cobertura do<br />Mosteiro, fresco silêncio<br />aguarela em pedra, Deus<br /><br /><br />03<br /><br />este é o pecado que resta<br />a maçã derradeira do pomar<br />aguardaria a serpente<br />se tempo houvesse mas o desejo<br />é semear caminho na memória<br />e esta maçã que há a provar<br />é parte do por quê de caminhar<br /><br />04<br /><br />(adivinho / adivinha)<br />se sei onde está a pedra<br />não tropeço e sigo,<br />sabendo como é Deus<br />não (o) procuro!<br />agora (o) sobrenatural<br />faz-se parte da arte<br />e não há poesia<br />sem me sentir divino!...<br /><br />05<br /><br />Caio em mim.<br />Não em pensamentos.<br />Não em auroras das revelações do espírito.<br />Não!<br />Caio em mim<br />sem que um pensamento viva ou morra.<br />Caio em mim:<br />sem pressas<br />nem amanhãs.<br />Nem ontem<br />nem tempo....<br />Apenas o Agora: o sentido do infinito.<br />Sou....<br />Particula do Nada.<br />Onde nada começa.<br />Intemporal<br />onde o meu descansar de Deus<br />No Tempo sem tempo<br />Tropeça....<br /><br />06<br /><br />se caio em mim<br />agora, hoje,<br />na pedra o futuro,escrito,<br />no silencio a visão,<br />clara, do tudo,onde nada<br />recomeça<br />flui, retoma<br />como a água fresca,<br />caída da fonte, reinicia<br />do colorido das pedras<br />de seixos rolados<br />como eu, sei<br />como sei de deus<br />tropeço, bambeio<br />mas não caio.<br /><br />07<br /><br />Conheci a pedra primeiro<br />depois... amei deus<br />por amar a pedra amei deus<br />e na perda da pedra<br />tudo aconteceu!!!<br />A (deus)<br /><br />08<br /><br />... algo indefinido, imaterial,<br />névoa que se não dissipa, esparge,<br />indelével num espaço que abriga,<br />força maior que não lobriga,<br />pedra tosca no caminho<br />que contorna,<br />não tropeça, adivinha,<br />protecção sempre presente,<br />intuição que avisa,<br />obstáculo que evita,<br />levita,<br />divindade maior que sente,<br />estando ausente,<br />acaso que pressente<br />num instante, num repente,<br /><br />local de perigo iminente,<br />ciclo reversível,<br />queda do espírito, da mente,<br />corpo que não rasga no duro asfalto,<br />contacto permanente<br />da espiritualidade<br />dum Deus que protege<br />quando age na voragem que consome,<br />irrealidade,<br /><br />abstracção que bloqueia,<br />incendeia,<br />não tropeça<br />se contorna,<br />quando adorna<br />feérico na crença,<br />quando pensa,<br />pedra angular que provocaria queda,<br />culpa que pesa,<br />cometimento menos feliz,<br />imaterial, indefinida,<br />como névoa que esparge,<br />assim age,<br /><br />espaço curto que diz,<br />respeito profundo por quem sente<br />algo maior na vida,<br /><br />falha grave,<br />peso constante que menoriza,<br />inferioriza,<br />sangra na interioridade que desconforta,<br />quando aporta<br />na baía do sossego,<br />partilha<br />réstia de pavor, de medo,<br />intimo refugio, algum segredo!!!...<br /><br />09<br /><br />Quando em certa época<br />decidi virar cigana,<br />percorri meio mundo.<br />Fui poeta, cantora...<br />Amei loucamente,<br />briguei com sofreguidão.<br />Nada fazia<br />que fosse<br />pela metade.<br />Agora, tudo me soa<br />inverossímil.<br />Parece fruto<br />de minha imaginação.<br />Quem sabe preciso<br />urgentemente<br />de psicanálise?<br />De regressão<br />a vidas passadas?<br />Sinto-me multifacetada.<br />Busco um rumo<br />na minha estrada...<br /><br />10<br /><br />Sei de pedra.<br />Como sei (também) de Deus,<br />por isto - tropeço.<br />Por saber de pedra<br />ou por saber<br />de Deus?<br /><br />11<br /><br />Irriguei a boca com ar<br />afundei o céu<br />no meu corpo<br />fui para o infinito<br />cumprir pena que sabia.<br /><br /><br /><em>Autores que participaram no desafio:<br /><br /><br />01 - Bernardete Costa<br />02 - José Gil<br />03 - Xavier Zarco<br />04 - Francisco Coimbra<br />05 - Carlos Luanda<br />06 - Sónia Regina<br />07 - Ísis<br />08 - Manuel Xarepe<br />09 – Belbedere Bruno<br />10 - Dalva Agne Lynch<br />11 – Ana Mª Costa<br /></em><br />* Moderado por Ana Maria Costa</div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com3tag:blogger.com,1999:blog-3496254361573858275.post-41303944868535998982007-07-17T01:28:00.002-07:002007-07-17T02:09:18.765-07:00Entrevista José Nascimento Félix *<div align="justify">por Vera Carvalho e Carlos Luanda</div><div align="justify"></div><div align="justify"><strong>1. José Félix, falar de poesia e encontrar tempo para ela na influência da<br />globalização, no confronto com tanta insensibilidade, parece-lhe precioso ou milagroso?<br /><br />José Félix</strong> – A globalização não me preocupa; nem um pouco. A globalização é o corredor que ficou mais curto para vermos a última porta. Sempre se lutou para que a humanidade ficasse cada vez mais perto. Porquê lutar agora contra esse objectivo, pois continuamos a querer ficar mais perto dos afegãos, dos habitantes da Mongólia, dos resquícios habitantes do Camboja que dizem algumas palavras em português dos séculos XVI e XVII e cujos membros se chamam de Silvas, Alves, Francisco? Não! A globalização é uma consequência do desenvolvimento tecnológico dos equipamentos da informação e, por isso, também à poesia respeita.<br />Não se pode dizer que haja «confronto com tanta insensibilidade». As sensibilidades são outras, são diferentes e não digo que houve uma evolução ou um retrocesso: são diferentes, e pronto. Será sempre precioso ou milagroso falar de poesia e do(s) confronto(s) que ela causa. A poesia é, em si, já um confronto entre diferentes personagens: a criação de um poema é como o nascimento de uma árvore através de uma semente minúscula.<br />O tempo em poesia não existe. A poesia é. Pode não haver oportunidade para a colocar num texto porque não se tem a capacidade literária para isso ou porque dá trabalho fazer a composição das palavras escolhidas ou das palavras que se nos oferecem para o poema. A poesia está intrinsecamente ligada à evolução da humanidade. Evolui-se porque há poesia, porque se pensa poesia, porque se deseja poesia. O homem que inventou a primeira letra de câmbio para o comércio internacional foi um poeta.<br /><br /><br /><strong>2. Fazendo uso das suas palavras,<br /><br />(…)não que eu encerrecada letra em cada quadrícula;não conjuga com a minha maneirade ser.desordenado, intuitivo e, até, porquepareceria que cada letra gritasse o somque lhe pertence num quadrado de ferrocomo se fosse uma prisão - as prisõessão incompatíveis com as palavras,conjuntos de letras feitas significantes,à espera da boca de quem lhes queira,na pronúncia, tomar o sabor original(…) (in poema "A minha caneta é azul"),<br /><br />acha que a poesia é apenas o veículo do sentimento, sem obedecer a regras, ao ritmo ou uma arte literária com as normas da arte?<br /></strong><br /><strong>J.F.</strong> – Se têm lido muito do que eu tenho escrito em livros, antologias, páginas na Rede e nas listas de discussão verificam que no meio de uma certa desordem, até caos, há implicitamente regras e uma constante procura do ritmo e da musicalidade de um verso. O poema referido, escrito no ano de 1999, creio, é mais um manifesto acerca do que eu pensava, e, ainda, penso, do modo de criação poética. Não faria sentido colocar e / ou transmitir aquelas premissas num soneto ou numa quintilha. Isto, por um lado. Por outro lado não vejo que um soneto, que obedece a um esquema formal bastante rígido seja cerceador da liberdade poética. No soneto, nas quadras, nas redondilhas, maior e menor, nos vilancetes, podemos dizer e transmitir o que quisermos sem que a liberdade discursiva sofra qualquer dano. Tenho poemas com as estruturas mas diversas e nunca me senti apertado na cintura ao fazê-los.<br />A poesia como arte, pois não está directamente relacionada com a sobrevivência ou com a reprodução, transmite sensações e emoções, verdadeiras ou não, e não há normas para a produção artística. Quem confere uma certa "normalidade" são os leitores, críticos, que no conjunto da leitura da obra de um autor, vêem nela um «estilo», uma "norma" para classificação futura. É assim que se criam os «ismos» possíveis em tudo e, também, na arte que é, ela própria, um nome definitivamente vago.<br />De então para cá, desde a escritura do poema «a minha caneta é azul», a minha construção discursiva tem tido a mesma atitude pela diferença, pela experimentação contínua da linguagem numa procura constante do imo da palavra, da frase, do texto. Hoje só escrevo com tinta preta. Amanhã é possível escrever com tinta verde, amarela.<br /><br /><br /><strong>3. Acha que "há duas coisas na vida de que vale a pena escrever: amar e a morte".<br />Ainda se recorda do seu primeiro poema, do tema, do porquê da escrita?<br /></strong><br /><strong>J.F.</strong> – O meu primeiro poema, do qual a minha memória tem o fumo possível é sobre um pássaro que pousou num galho de goiabeira; um poema escrito aos 15 anos e com os ingredientes de um jovem daquela idade.<br />A escrita é uma passadeira entre dois estádios: às vezes comungam outras vezes não. Quase sempre não comungam.<br />Vivi sempre em exílio: exilo físico e exílio não físico. Recordo-me de fazer as orações a Adonai, à tardinha de sexta-feira numa casa, em Luanda, cujo proprietário era o dono de um dos mais famosos restaurantes e cervejarias da cidade: Dario Aleksandr Dukasky, um judeu dos puros, duro, ortodoxo, onde os meus pais iam com frequência. Permanece, e, ainda, depois da morte, um respeito muito grande por quem, no abrigo da sua casa, acolhia os membros de uma nação fustigada pela incompreensão dos países árabes, e por aqueles que nunca lutaram pela pátria que é hoje o Estado de Israel. Foi o início de um exílio já feito no núcleo familiar e que depois foi transportado pela via da escrita para outros exílios construídos através da palavra. Um poeta é um exilado da norma porque para o ser deve construir o seu próprio território.<br />Amar e a morte. Só vale a pena escrever sobre estas duas coisas. "Amar" é uma construção de gestos pessoais e intransmissíveis. Não falo em amor porque é um conceito muito vago e que vai mudando consoante o tempo. Amar! Sobretudo, amar! Aqui reside o meio de caminhar. A morte é a finalidade de todas as coisas. O fim. Zero. Embora o número "zero" se assemelhe a uma semente e uma semente seja a renovação de qualquer coisa: uma árvore, um arbusto, uma erva daninha. É o pensamento metafísico da morte. É sobre ela que escrevemos.<br /><br /><br /><strong>4. Para quem nunca teve a vivência prática da poesia, muitas das definições podem parecer assunto quase místico. Gostaria de deixar algumas palavras para os escritores que estão a iniciar agora?<br /></strong><br /><strong>J.F.</strong> – A prática da poesia. A prática da escrita. Ambas são íntimas. Não se pode desligar uma da outra. Escrever. Escrever. Escrever. Ler. Ler. Ler. A leitura e a escrita são irmãs. Escreve-se porque se lê e lê-se porque se escreve. A leitura dos clássicos é muito importante. O pregão constante do que é «moderno», e de uma forma errada, penso, afasta os jovens dos clássicos, esses, sim, plenos de modernidade. Alguém pensa que não é moderno o soneto de Camões onde diz "mudam-se os tempos mudam-se as vontades"? Isto não é moderno? As duas quadras que compõem o soneto estão actuais. Isto é que é ser moderno. Foi escrito no século XVI! Ler os autores gregos, latinos, os autores da Renascença. Para se ter um bom conhecimento da escrita em português é necessário ler Eça de Queiroz e o Padre António Vieira, portugueses, e autores brasileiros como Graciliano Ramos, Machado de Assis, Guimarães Rosa.<br /><br /><br /><strong>5. José Félix, a excelência do Mestre que dele faz nascer Escola, também o encerra num invólucro onde muitas vezes fica refém dos seus próprios horizontes e excelência. Sendo um inovador constante num constante romper e renascer, não teme que a sua escrita possa fazer Escola e que assim de alguma forma acabe por aprisioná-lo e limitá-lo?<br /></strong><br /><strong>J.F.</strong> – Esta questão é interessante pois encerra uma pretensa contradição. Se fico refém dos meus próprios horizontes não posso ser "inovador constante num constante romper e renascer". Ora, eu não estou num invólucro nem estou refém de qualquer horizonte. Eu não tenho horizontes, se bem que o horizonte é um conceito com uma grande mobilidade. Basta caminharmos para qualquer direcção para perceber que o horizonte muda de longitude e de latitude. Mesmo assim não me sinto manietado naquilo que pretendo fazer com a escrita: experimentação. A Escola é a liberdade da imaginação transposta para a escrita. A inovação pode ser feita com as velhas ferramentas, sendo a escrita a ferramenta principal: é o cinzel, o martelo, a colher do barro, a água, o molde o objecto moldado; é o espelho e o reflexo, o côncavo e o convexo, o "se" e o "és". A escrita é o dentro e o fora, o centro e a fuga. A Escrita não é uma prisão!<br /><br /><br /><br /><strong>6. Quem nasceu ou viveu em África trá-la e ao seu ritmo, para sempre, no coração. Crê que África, tal como na música, é também mãe de toda a palavra, ou pensa que na génese ambas seriam o mesmo?<br /></strong><br /><strong>J.F.</strong> – Sabe-se que o homem desenvolveu-se em África, na costa oriental, na região que é hoje a Tanzânia e o Quénia até surgirem outras provas documentais fossilizadas. Sendo assim, também a palavra nasceu aí. África é o continente da desgraça. Não entendo porque se trata o continente africano como uma terra à parte depois de mais de cinco séculos de colonialismo e quase cem de neocolonialismo. Se a Europa e o resto do mundo gosta tanto de África porque se continua a espezinhar os africanos, a humilhá-los e a dar-lhes migalhas quando a sua matéria-prima alimenta os bolsos dos empresários europeus.<br />Em África, mais precisamente a África subsaariana, a música e a palavra andam sempre unidas. A não ser por influência europeia, nas línguas naturais bantos não há rima. São línguas de uma simplicidade tal que não precisam de artigos partitivos, pronomes e o plural dos nomes lembra o que acontece com o latim. Basta ter um conhecimento primário do crioulo de Cabo Verde para perceber a simplicidade comunicacional de uma língua híbrida como o crioulo onde o masculino prevalece.<br />Eu digo, sim, que África é a mãe de toda a palavra e de toda a música. E não só. África é a mãe de todas as artes. Pablo Picasso inspirou-se nas esculturas e desenhos africanos para desenvolver o cubismo. Claude Debussy ouviu música africana para se tornar o primeiro autor clássico da era moderna. Ouça-se "La Cathédral engloutie" que é uma obra-prima.<br />E, já agora, como um complemento, leia-se o poema com o mesmo nome e com aquele fundo musical, de Jorge de Sena.<br /><br /><strong>7. Como encara o facto de a palavra ter sempre um valor transitório e finito, (um jogo entre todos os Eros e Morte?). Não correrão os poetas atrás da magia quimérica dos sons da imortalidade?<br /><br /><br />J.F.</strong> – Não! A palavra não tem um valor transitório. A palavra, desde que seja dita, lida, ouvida por alguém, tem vida, transforma-se, metamorfoseia-se nos significantes e nos significados quando corre séculos e milénios. Não é por acaso que há especialistas que tentam, através da História das mentalidades, retirar o sentido da época nas palavras que lêem e decifram. O poeta é, ele próprio, um alquimista. Procura a transmutação do «ser» pela palavra, pela ideia intrínseca de um verso, um poema, um texto.<br />Não deixa de ser um jogo entre todos os Eros e Morte, mas, apesar de um texto estar perdido numa estante qualquer de uma qualquer biblioteca, mesmo labiríntica como a de Borges, um dia, num simples dia, um olhar pousará nas páginas e o poeta renascerá das cinzas, mesmo que algum índex queime as capas desse livro.·<br /><br /><strong>8. A sua formação em História deve tê-lo posto perante a sensação de máquina do tempo que se tem quando se lê um poema escrito à distância de milénios.Quer partilhar connosco algumas breves passagens de poemas imemoriais que o sensibilizaram definitivamente como homem e poeta?</strong></div><div align="justify"></div><div align="justify"><strong>J.F.</strong> – A poesia do Antigo Egipto é muito interessante. O "O Livro dos Mortos", principalmente o capítulo 42 quando o defunto pretende tomar as formas de Ré, invocando a protecção dos vários deuses é sublime.<br /><br />"[…]<br />Eu sou Ré, aquele cujos favores são duráveis.<br />Eu sou o criador que está no tamariz.<br />Se eu estou intacto Ré está intacto, e vice-versa.<br />Os meus cabelos são os de Nun.<br />O meu rosto é o de Ré.<br />Os meus olhos são os de Hathor.<br />As minhas orelhas são as de Uepuanet.<br />O meu nariz é o de Khentkhas.<br />Os meus lábios são os de Anubis.<br />Os meus dentes são os de Serket.<br />Os meus molares são os de Ísis, a divina<br />Os meus braços são os de Banebdjedet.<br />O meu pescoço é o de neit, senhora de Sais.<br />As minhas costas são as de Set.<br />O meu falo é o de Osíris.<br />As minhas carnes são as dos senhores de Kheraha.<br />O meu peito é o do Grande de prestígio.<br />O meu ventre e a minha coluna vertebral.<br />São os de Sekhemet.<br />As minhas nádegas são as do Olho de Hórus.<br />As minhas coxas e as minhas barrigas das pernas são as de Nut.<br />As minhas pernas são as de Ptah.<br />Os meus dedos dos pés são os dos falcões vivos.<br />Não há em mim um membro que não tenha um deus.<br />Tot é a protecção de todos os meus membros.<br />Eu sou Ré de cada dia..<br /><br />Simplesmente grandioso!<br /><br />A poesia no Antigo Egipto, mormente o erotismo tinha várias funções: demiúrgica, profilática. Havia uma poesia porno-concupiscente.<br />A poesia japonesa e chinesa tem um lugar cativo. Matsuo Bashô, o criador do haicai é de uma síntese incrível e com um olhar zen sobre a natureza que impressiona.<br /><br /><br />A pequena lagarta<br />Vê passar o outono<br />Sem pressa de se tornar borboleta.<br /><br />A poesia chinesa dos séculos X a 13. O chinês Su Dongpo.<br /><br />Vigésimo sétimo dia do sexto mês, poema composto estando eu embriagado, no Pavilhão da Contemplação do Lago<br /><br />Peixes e tartarugas em liberdade me vêm seguindo<br />Lótus selvagens flores cem por todo o lado<br />Embalado pela água, da minha almofada vejo o vaivém da montanha<br />Levada pela brisa a minha barca sabe seguir o vagar da lua.<br /><br />Su Dongpo<br /><br />Os poetas árabes do Al-Andaluz como A- Um'tamid, Ibn Amar.<br /><br />Há muitos outros, a lista é longa e seria fastidioso enumerá-los todos e transcrever alguns textos sublimes.<br />Aconselho vivamente a leitura do livro "poesia de 26 séculos", antologia, tradução, prefácio e notas de Jorge de Seana, edições ASA, 3ª edição, Lisboa, 2001. Percorre um espaço temporal que vai desde Arquíloco, poeta jónico do século 8 a.C. até Friedrich Nietzsche falecido no ano de 1900.<br /><br /><br /><br /><strong>9. Perguntar pelo futuro é já um lugar-comum, um cliché, mas correndo esse risco perguntar-lhe ia que horizontes desejaria romper um dia?<br /></strong><br /><strong>J.F.</strong> – Parafraseando o poeta espanhol António Machado, faço a vida caminhando. Não penso no futuro. O que me interessa é o presente que é a construção dele, do futuro, onde rompo as barreiras que se me apresentam necessárias para serem ultrapassadas.<br />A escrita é um instrumento fundamental para se quebrarem muitas barreiras: conceitos, que são construções espácio-temporais, como os conceitos morais ou religiosos, autênticas barreiras que impedem a humanidade de conviver com o total respeito pela diferença.<br /></div><div align="justify"><strong>10. Senhor José Félix, muito obrigado pelas suas palavras. Quer deixar uma mensagem, uma frase, uma ideia particular aos nossos companheiros da Lista?<br /><br />J.F. -</strong> Escrever o poema como se fosse o último da vida.</div><p></p><p align="justify"><strong>*Entrevista a José Nascimento Félix<br /><br />José Nascimento Félix, natural de Angola, nascido em 1946, em Luanda.Licenciado em História pela F.C.S.H. da Universidade Nova de Lisboa.<br />Promove a frequência de listas de discussão poética na Rede, tendo criado a lista Escritas suportada pela página literária pessoal Encontro de Escritas, em <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.escritas.paginas.sapo.pt/" target="_blank">http://www.escritas.paginas.sapo.pt/</a>, com entrevistas, divulgação de poemas e novos poetas de língua portuguesa. Análise, crítica literária, ensaio, trabalhos feitos por alguns associados para um grupo de cerca de 200 autores e/leitores de Portugal, Brasil, Angola, Moçambique e Guiné-Bissau.<br /><br />Obra literária :<br />- Geografia da Árvore (a reinvenção da memória), Col. Poéticas de Lav(r)a, Múchia Publicações, Lda., Funchal, Outubro de 2003<br />Está publicado em várias antologias, destacando-se a Antologia de Poesia Actual Portuguesa, em edição bilingue, português e castelhano, de 2006, e uma colaboração com o poeta brasileiro, Aníbal Beça, membro da Academia Amazonense de Letras, no livro "Chá das Quatro", com haicais e que integra o livro Folhas da Selva, Editora Valer, Brasil<br />- Antologia Horizontes do PD-Literatura, Brasil, 1999 - Poiesis II, Poiesis III da Editorial Minerva (MNA), Portugal, 1999, 2000 - Antologia "Incomensurável" - Poesia a treze, Editorial Minerva, Portugal, 2000 - "Inspiração Erótica" - Antologia da Associação Cultural de Jundiaí, Brasil, 2000 - "Espelhos da Língua" da Sociedade de Escritores de Blumenau, Brasil, 2001 - "Quatro Poetas da Net", Edições Sete Sílabas, Setembro, Lisboa, 2002 - "Prosa & Verso", Projecto Palavra Azuis, Vol.2, da Sociedade de Escritores de Blumenau. - "Encontro de Escritas" – Antologia nº1, Lisboa, 2004 - "Encontro de Escritas" – Antologia nº2, Lisboa, 2005 - "Encontro de Escritas" – Antologia nº3, Lisboa, 2006 - "Encontro de Escritas" – Antologia nº4, Lisboa, 2007 Prefaciou os livros "<a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.3poetasemleiria.pt/" target="_blank">http://www.3poetasemleiria.pt/</a>", de José Gil, Don Lackewood e Constantino Alves."Laços & Lazos", um livro bilingue, de José Gil e Sónia Regina"De cada poro um poema" de Antoniel Campos"Catavento" de Everardo Torrez Getz, autor mexicano."Esfinge Lunar" de Goulart Gomes, poeta da Bahia, Brasil<br />Muitos dos seus trabalhos estão publicados na Rede, em várias páginas literárias digitais portuguesas e brasileiras, como a <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://zonanon.org/index.html" target="_blank">[NON</a>], <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.usinadeletras.com.br/" target="_blank">Usina de Letras</a>, <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.palavreiros.org/festivalmundial/home.html" target="_blank">Palavreiros</a>, <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.navedapalavra.com.br/" target="_blank">Nave da Palavra</a> <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://alternancia.no.sapo.pt/" target="_blank">Alternância</a>, <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.secrel.com.br/jpoesia/poesia.html" target="_blank">Jornal de Poesia</a> , Encontro de Escritas, <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://www.seixoreview.com/" target="_blank">Seixo Review</a> e no seu blog <a onclick="return top.js.OpenExtLink(window,event,this)" href="http://ateiadaaranh/" target="_blank">http://ateiadaaranh/</a>a.blogspot.com/</strong></p><div align="justify"></div>Filipa Rodrigueshttp://www.blogger.com/profile/02769812270192237100noreply@blogger.com1